sexta-feira, 30 de maio de 2014

STJ - Informativo Nº: 0540 Período: 28 de maio de 2014.

Informativo Nº: 0540      Período: 28 de maio de 2014.
As notas aqui divulgadas foram colhidas nas sessões de julgamento e elaboradas pela Secretaria de Jurisprudência, não consistindo em repositórios oficiais da jurisprudência deste Tribunal.
Corte Especial
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. MOMENTO PARA HABILITAÇÃO COMO AMICUS CURIAE EM JULGAMENTO DE RECURSO SUBMETIDO AO RITO DO ART. 543-C DO CPC.
O pedido de intervenção, na qualidade de amicus curiae, em recurso submetido ao rito do art. 543-C do CPC, deve ser realizado antes do início do julgamento pelo órgão colegiado. Isso porque, uma vez iniciado o julgamento, não há mais espaço para o ingresso de amicus curiae. De fato, já não há utilidade prática de sua intervenção, pois nesse momento processual não cabe mais sustentação oral, nem apresentação de manifestação escrita, como franqueia a Resolução 8/2008 do STJ, e, segundo assevera remansosa jurisprudência, oamicus curiae não tem legitimidade recursal, inviabilizando-se a pretensão de intervenção posterior ao julgamento (EDcl no REsp 1.261.020-CE, Primeira Seção, DJe 2/4/2013). O STJ tem entendido que, segundo o § 4º do art. 543-C do CPC, bem como o art. 3º da Resolução 8/2008 do STJ, admite-se a intervenção de amicus curiae nos recursos submetidos ao rito dos recursos repetitivos somente antes do julgamento pelo órgão colegiado e a critério do relator (EDcl no REsp 1.120.295-SP, Primeira Seção, DJe 24/4/2013). Ademais, o STF já decidiu que o amicus curiae pode pedir sua participação no processo até a liberação do processo para pauta (ADI 4.071 AgR, Tribunal Pleno, DJe 16/10/2009). QO no REsp 1.152.218-RS, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 7/5/2014.

DIREITO PROCESSUAL CIVIL E EMPRESARIAL. CLASSIFICAÇÃO DE CRÉDITO REFERENTE A HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS NO PROCESSO DE FALÊNCIA. RECURSO REPETITIVO (ART. 543-C DO CPC E RES. N. 8/2008-STJ).
Os créditos resultantes de honorários advocatícios, sucumbenciais ou contratuais, têm natureza alimentar e equiparam-se aos trabalhistas para efeito de habilitação em falência, seja pela regência do Decreto-lei 7.661/1945, seja pela forma prevista na Lei 11.101/2005, observado o limite de valor previsto no art. 83, I, do referido diploma legal. A questão deve ser entendida a partir da interpretação do art. 24 da Lei 8.906/1994 (EOAB), combinado com o art. 102 do Decreto-lei 7.661/1945, dispositivo este cuja regra foi essencialmente mantida pelo art. 83 da Lei 11.101/2005 no que concerne à posição dos créditos trabalhistas e daqueles com privilégio geral e especial. Da interpretação desses dispositivos, entende-se que os créditos decorrentes de honorários advocatícios, contratuais ou sucumbenciais, equiparam-se a créditos trabalhistas para a habilitação em processo falimentar. Vale destacar que, por força da equiparação, haverá o limite de valor para o recebimento – tal como ocorre com os credores trabalhistas –, na forma preconizada pelo art. 83, I, da Lei de Recuperação Judicial e Falência. Esse fator inibe qualquer possibilidade de o crédito de honorários obter mais privilégio que o trabalhista, afastando também suposta alegação de prejuízo aos direitos dos obreiros. Precedentes citados do STJ: REsp 988.126-SP, Terceira Turma, DJe 6/5/2010; e REsp 793.245-MG, Terceira Turma, DJ 16/4/2007. REsp 1.152.218-RS, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 7/5/2014.

DIREITO PROCESSUAL CIVIL E EMPRESARIAL. CLASSIFICAÇÃO DE CRÉDITO REFERENTE A HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS POR SERVIÇOS PRESTADOS À MASSA FALIDA. RECURSO REPETITIVO (ART. 543-C DO CPC E RES. N. 8/2008-STJ).
São créditos extraconcursais os honorários de advogado resultantes de trabalhos prestados à massa falida, depois do decreto de falência, nos termos dos arts. 84 e 149 da Lei 11.101/2005. De início, cumpre ressaltar que os credores da falida não se confundem com os credores da massa falida. Os credores da falida são titulares de valores de origem anterior à quebra, que devem ser habilitados no quadro geral de créditos concursais pela regência da nova lei (art. 83 da Lei 11.101/2005). As dívidas da massa falida, por sua vez, são créditos relacionados ao próprio processo de falência, nascidos, portanto, depois da quebra, e pelo atual sistema legal devem ser pagos antes dos créditos concursais (art. 84 da Lei 11.101/2005), com exceção dos créditos trabalhistas de natureza estritamente salarial vencidos nos três meses anteriores à decretação da falência, que serão pagos tão logo haja disponibilidade em caixa (art. 151 da Lei 11.101/2005). Em outras palavras, os serviços prestados à massa falida após a decretação da falência são créditos extraconcursais (arts. 84 e 149 da Lei 11.101/2005), que devem ser satisfeitos antes, inclusive, dos trabalhistas, à exceção do que dispõe o art. 151. REsp 1.152.218-RS, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 7/5/2014.

DIREITO PROCESSUAL CIVIL. IMPUGNAÇÃO AO CUMPRIMENTO DE SENTENÇA POR EXCESSO DE EXECUÇÃO. RECURSO REPETITIVO (ART. 543-C DO CPC E RES. 8/2008-STJ).
Na hipótese do art. 475-L, § 2º, do CPC, é indispensável apontar, na petição de impugnação ao cumprimento de sentença, a parcela incontroversa do débito, bem como as incorreções encontradas nos cálculos do credor, sob pena de rejeição liminar da petição, não se admitindo emenda à inicial. O art. 475-L, § 2º, do CPC, acrescentado pela Lei 11.232/2005, prevê que “Quando o executado alegar que o exeqüente, em excesso de execução, pleiteia quantia superior à resultante da sentença, cumprir-lhe-á declarar de imediato o valor que entende correto, sob pena de rejeição liminar dessa impugnação”. Segundo entendimento doutrinário, o objetivo dessa alteração legislativa é, por um lado, impedir que o cumprimento de sentença seja protelado por meio de impugnações infundadas e, por outro lado, permitir que o credor faça o levantamento da parcela incontroversa da dívida. Sob outro prisma, a exigência do art. 475-L, § 2º, do CPC é o reverso da exigência do art. 475-B do CPC, acrescentado pela Lei 11.232/2005. Este dispositivo estabelece que, se os cálculos exequendos dependerem apenas de operações aritméticas, exige-se que o credor apure o quantum debeatur e apresente a memória de cálculos que instruirá o pedido de cumprimento de sentença – é a chamada liquidação por cálculos do credor. Por paridade, a mesma exigência é feita ao devedor, quando apresente impugnação ao cumprimento de sentença. Além disso, o STJ tem conferido plena efetividade ao art. 475-L, § 2º, do CPC, vedando, inclusive, a possibilidade de emenda aos embargos/impugnação formulados em termos genéricos (EREsp 1.267.631-RJ, Corte Especial, DJe 1/7/2013). Por fim, esclareça-se que a tese firmada não se aplica aos embargos à execução contra a Fazenda Pública, tendo em vista que o art. 475-L, § 2º, do CPC não foi reproduzido no art. 741 do CPC. Precedentes citados: REsp 1.115.217-RS, Primeira Turma, DJe 19/2/2010; AgRg no Ag 1.369.072-RS, Primeira Turma, DJe 26/9/2011. REsp 1.387.248-SC, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 7/5/2014.

DIREITO PROCESSUAL CIVIL. EXTINÇÃO DA OBRIGAÇÃO DO DEVEDOR PELO DEPÓSITO JUDICIAL. RECURSO REPETITIVO (ART. 543-C DO CPC E RES. 8/2008-STJ).
Na fase de execução, o depósito judicial do montante (integral ou parcial) da condenação extingue a obrigação do devedor, nos limites da quantia depositada. A questão jurídica ora sujeita à afetação ao rito do art. 543-C do CPC, “responsabilidade do devedor pelo pagamento de juros de mora e correção monetária sobre os valores depositados em juízo na fase de execução”, foi exaustivamente debatida no STJ, tendo-se firmado entendimento no sentido da responsabilidade da instituição financeira depositária, não do devedor, pela remuneração do depósito judicial. Sobre o tema da remuneração dos depósitos judiciais, houve inclusive a edição de duas súmulas, embora restritas à questão da correção monetária. Com efeito, dispõe a Súmula 179 do STJ que “O estabelecimento de crédito que recebe dinheiro, em depósito judicial, responde pelo pagamento da correção monetária relativa aos valores recolhidos”. A Súmula 271 do STJ, por sua vez, estabelece que “A correção monetária dos depósitos judiciais independe de ação específica contra o banco depositário”. Verifica-se, portanto, ser pacífica a jurisprudência do STJ quanto ao aspecto em discussão. No entanto, diante da multiplicidade de recursos especiais referentes a essa mesma controvérsia, tornou-se necessário afetar a matéria ao rito do art. 543-C do CPC, optando-se por consolidar a seguinte tese: “na fase de execução, o depósito judicial do montante (integral ou parcial) da condenação extingue a obrigação do devedor, nos limites da quantia depositada”. Nessa redação, decidiu-se limitar a tese à fase de execução, pois, na fase de conhecimento, o devedor somente é liberado dos encargos da mora se o credor aceitar o depósito parcial. É o que se depreende do disposto no art. 314 do CC, segundo o qual “Ainda que a obrigação tenha por objeto prestação divisível, não pode o credor ser obrigado a receber, nem o devedor a pagar, por partes, se assim não se ajustou”. Precedentes citados: EREsp 1.306.735-MG, Corte Especial, DJe 29/5/2013; e EREsp 119.602-SP, Corte Especial, DJ 17/12/1999. REsp 1.348.640-RS, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 7/5/2014.

Primeira Seção
DIREITO TRIBUTÁRIO. INCIDÊNCIA DE CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA SOBRE VERBAS TRABALHISTAS. RECURSO REPETITIVO (ART. 543-C DO CPC E RES. 8/2008-STJ).
Estão sujeitas à incidência de contribuição previdenciária as parcelas pagas pelo empregador a título de horas extras e seu respectivo adicional, bem como os valores pagos a título de adicional noturno e de periculosidade. Por um lado, a Lei 8.212/1991, em seu art. 22, I, determina que a contribuição previdenciária a cargo da empresa é de "vinte por cento sobre o total das remunerações pagas, devidas ou creditadas a qualquer título, durante o mês, aos segurados empregados e trabalhadores avulsos que lhe prestem serviçosdestinadas a retribuir o trabalho, qualquer que seja a sua forma, inclusive as gorjetas, os ganhos habituais sob a forma de utilidades e os adiantamentos decorrentes de reajuste salarial, quer pelos serviços efetivamente prestados, quer pelo tempo à disposição do empregador ou tomador de serviços, nos termos da lei ou do contrato ou, ainda, de convenção ou acordo coletivo de trabalho ou sentença normativa". Por outro lado, o § 2° do art. 22 da Lei 8.212/1991, ao consignar que não integram o conceito de remuneração as verbas listadas no § 9° do art. 28 do mesmo diploma legal, expressamente exclui uma série de parcelas da base de cálculo do tributo. Com base nesse quadro normativo, o STJ consolidou firme jurisprudência no sentido de que não sofrem a incidência de contribuição previdenciária "as importâncias pagas a título de indenização, que não correspondam a serviços prestados nem a tempo à disposição do empregador" (REsp 1.230.957-RS, Primeira Seção, DJe 18/3/2014, submetido ao rito do art. 543-C do CPC). Nesse contexto, se a verba trabalhista possuir natureza remuneratória, destinando-se a retribuir o trabalho, qualquer que seja a sua forma, ela deve integrar a base de cálculo da contribuição. Desse modo, consoante entendimento pacífico no âmbito da Primeira Seção do STJ, os adicionais noturno e de periculosidade, as horas extras e seu respectivo adicional constituem verbas de natureza remuneratória, razão pela qual se sujeitam à incidência de contribuição previdenciária. Precedentes citados: REsp 1.098.102-SC, Primeira Turma, DJe 17/6/2009; e AgRg no AREsp 69.958-DF, Segunda Turma, DJe 20/6/2012. REsp 1.358.281-SP, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 23/4/2014.

Segunda Seção
DIREITO CIVIL. DEDUÇÃO DO DPVAT DO VALOR DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS.
O valor correspondente à indenização do seguro de danos pessoais causados por veículos automotores de via terrestre (DPVAT) pode ser deduzido do valor da indenização por danos exclusivamente morais fixada judicialmente, quando os danos psicológicos derivem de morte ou invalidez permanente causados pelo acidente. De acordo com o art. 3º da Lei 6.194/1974, com a redação dada pela Lei 11.945/2009, os danos pessoais cobertos pelo seguro obrigatório compreendem “as indenizações por morte, por invalidez permanente, total ou parcial, e por despesas de assistência médica e suplementares”. Embora o dispositivo especifique quais os danos passíveis de indenização, não faz nenhuma ressalva quanto aos prejuízos morais derivados desses eventos. A partir de uma interpretação analógica de precedentes do STJ, é possível concluir que a expressão “danos pessoais” contida no referido artigo abrange todas as modalidades de dano –  materiais, morais e estéticos –, desde que derivados dos eventos expressamente enumerados: morte, invalidez permanente e despesas de assistência médica e suplementares. Nesse aspecto, “a apólice de seguro contra danos corporais pode excluir da cobertura tanto o dano moral quanto o dano estético, desde que o faça de maneira expressa e individualizada para cada uma dessas modalidades de dano extrapatrimonial” (REsp 1.408.908-SP, Terceira Turma, DJe de 19/12/2013). De forma semelhante, o STJ também já decidiu que “a previsão contratual de cobertura dos danos corporais abrange os danos morais nos contratos de seguro” (AgRg no AREsp 360.772-SC, Quarta Turma, DJe de 10/9/2013). Acrescente-se que o fato de os incisos e parágrafos do art. 3º da Lei 6.194/1974 já fixarem objetivamente os valores a serem pagos conforme o tipo e o grau de dano pessoal sofrido não permite inferir que se esteja excluindo dessas indenizações o dano moral; ao contrário, conclui-se que nesses montantes já está compreendido um percentual para o ressarcimento do abalo psicológico, quando aplicável, como é o caso da invalidez permanente que, indubitavelmente, acarreta à vítima não apenas danos materiais (decorrentes da redução da capacidade laboral, por exemplo), mas também morais (derivados da angústia, dor e sofrimento a que se submete aquele que perde, ainda que parcialmente, a funcionalidade do seu corpo). REsp 1.365.540-DF, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 23/4/2014.

DIREITO CIVIL. IMPOSSIBILIDADE DE PURGAÇÃO DA MORA EM CONTRATOS DE ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA FIRMADOS APÓS A VIGÊNCIA DA LEI 10.931/2004. RECURSO REPETITIVO (ART. 543-C DO CPC E RES. 8/2008-STJ).
Nos contratos firmados na vigência da Lei 10.931/2004, que alterou o art. 3º, §§ 1º e 2º, do Decreto-lei 911/1969compete ao devedor, no prazo de cinco dias após a execução da liminar na ação de busca e apreensão, pagar a integralidade da dívida – entendida esta como os valores apresentados e comprovados pelo credor na inicial –, sob pena de consolidação da propriedade do bem móvel objeto de alienação fiduciária. De início, convém esclarecer que a Súmula 284 do STJ, anterior à Lei 10.931/2004, orienta que a purgação da mora, nos contratos de alienação fiduciária, só é permitida quando já pagos pelo menos 40% (quarenta por cento) do valor financiado. A referida súmula espelha a redação primitiva do § 1º do art. 3º do Decreto-lei 911/1969, que tinha a seguinte redação: “Despachada a inicial e executada a liminar, o réu será citado para, em três dias, apresentar contestação ou, se já houver pago 40% (quarenta por cento) do preço financiado, requerer a purgação de mora.”  Contudo, do cotejo entre a redação originária e a atual – conferida pela Lei 10.931/2004 –, fica límpido que a lei não faculta mais ao devedor a purgação da mora, expressão inclusive suprimida das disposições atuais, não se extraindo do texto legal a interpretação de que é possível o pagamento apenas da dívida vencida. Ademais, a redação vigente do art. 3º, §§ 1º e 2º, do Decreto-lei 911/1969 estabelece que o devedor fiduciante poderá pagar a integralidade da dívida pendente e, se assim o fizer, o bem lhe será restituído livre de ônus, não havendo, portanto, dúvida acerca de se tratar de pagamento de toda a dívida, isto é, de extinção da obrigação. Vale a pena ressaltar que é o legislador quem está devidamente aparelhado para apreciar as limitações necessárias à autonomia privada em face de outros valores e direitos constitucionais. A propósito, a normatização do direito privado desenvolveu-se de forma autônoma em relação à Constituição, tanto em perspectiva histórica quanto em conteúdo, haja vista que o direito privado, em regra, disponibiliza soluções muito mais diferenciadas para conflitos entre os seus sujeitos do que a Constituição poderia fazer. Por isso não se pode presumir a imprevidência do legislador que, sopesando as implicações sociais, jurídicas e econômicas da modificação do ordenamento jurídico, vedou para alienação fiduciária de bem móvel a purgação da mora, sendo, pois, a matéria insuscetível de controle jurisdicional infraconstitucional. Portanto, sob pena de se gerar insegurança jurídica e violar o princípio da tripartição dos poderes, não cabe ao Poder Judiciário, a pretexto de interpretar a Lei 10.931/2004, criar hipótese de purgação da mora não contemplada pela lei. Com efeito, é regra basilar de hermenêutica a prevalência da regra excepcional, quando há confronto entre as regras específicas e as demais do ordenamento jurídico. Assim, como o CDC não regula contratos específicos, em casos de incompatibilidade entre a norma consumerista e a aludida norma específica, deve prevalecer essa última, pois a lei especial traz novo regramento a par dos já existentes. Nessa direção, é evidente que as disposições previstas no CC e no CDC são aplicáveis à relação contratual envolvendo alienação fiduciária de bem móvel, quando houver compatibilidade entre elas. Saliente-se ainda que a alteração operada pela Lei 10.931/2004 não alcança os contratos de alienação fiduciária firmados anteriormente à sua vigência. De mais a mais, o STJ, em diversos precedentes, já afirmou que, após o advento da Lei 10.931/2004, que deu nova redação ao art. 3º do Decreto-lei 911/1969, não há falar em purgação da mora, haja vista que, sob a nova sistemática, após o decurso do prazo de 5 (cinco) dias contados da execução da liminar, a propriedade do bem fica consolidada em favor do credor fiduciário, devendo o devedor efetuar o pagamento da integralidade do débito remanescente a fim de obter a restituição do bem livre de ônus. Precedentes citados: AgRg no REsp 1.398.434-MG, Quarta Turma, DJe 11/2/2014; e AgRg no REsp 1.151.061-MS, Terceira Turma, DJe 12/4/2013. REsp 1.418.593-MS, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 14/5/2014.

DIREITO PROCESSUAL CIVIL. ASSISTÊNCIA SIMPLES EM PROCESSO SUBMETIDO AO RITO DO ART. 543-C DO CPC.
Não configura interesse jurídico apto a justificar o ingresso de terceiro como assistente simples em processo submetido ao rito do art. 543-C do CPC o fato de o requerente ser parte em outro feito no qual se discute tese a ser firmada em recurso repetitivo.Isso porque, nessa situação, o interesse do terceiro que pretende ingressar como assistente no julgamento do recurso submetido à sistemática dos recursos repetitivos é meramente subjetivo, quando muito reflexo, de cunho meramente econômico, o que não justifica sua admissão como assistente simples. Outrossim, o requerente não se enquadra no rol do art. 543-C, § 4º, do CPC, sendo certo ainda que nem mesmo aqueles inseridos da referida lista podem ser admitidos como assistentes no procedimento de recursos representativos, não sendo possível, também, a interposição de recurso por eles para impugnar a decisão que vier a ser prolatada. Ademais, a admissão da tese sustentada pelo requerente abriria a possibilidade de manifestação de todos aqueles que figuram em feitos que tiveram a tramitação suspensa em vista da afetação, o que, evidentemente, inviabilizaria o julgamento de recursos repetitivos. REsp 1.418.593-MS, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 14/5/2014.

Primeira Turma
DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. NÃO CONFIGURAÇÃO DE ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA.
Não configura improbidade administrativa a contratação, por agente político, de parentes e afins para cargos em comissão ocorrida em data anterior à lei ou ao ato administrativo do respectivo ente federado que a proibisse e à vigência da Súmula Vinculante 13 do STF. A distinção entre conduta ilegal e conduta ímproba imputada a agente público ou privado é muito antiga. A ilegalidade e a improbidade não são situações ou conceitos intercambiáveis, cada uma delas tendo a sua peculiar conformação estrita: a improbidade é uma ilegalidade qualificada pelo intuito malsão do agente, atuando com desonestidade, malícia, dolo ou culpa grave. A confusão conceitual que se estabeleceu entre a ilegalidade e a improbidade deve provir do caput do art. 11 da Lei 8.429/1992, porquanto ali está apontada como ímproba qualquer conduta que ofenda os princípios da Administração Pública, entre os quais se inscreve o da legalidade (art. 37 da CF). Mas nem toda ilegalidade é ímproba. Para a configuração de improbidade administrativa, deve resultar da conduta enriquecimento ilícito próprio ou alheio (art. 9º da Lei 8.429/1992), prejuízo ao Erário (art. 10 da Lei 8.429/1992) ou infringência aos princípios nucleares da Administração Pública (arts. 37 da CF e 11 da Lei 8.429/1992). A conduta do agente, nos casos dos arts. 9º e 11 da Lei 8.429/1992, há de ser sempre dolosa, por mais complexa que seja a demonstração desse elemento subjetivo. Nas hipóteses do art. 10 da Lei 8.429/1992, cogita-se que possa ser culposa. Em nenhuma das hipóteses legais, contudo, se diz que possa a conduta do agente ser considerada apenas do ponto de vista objetivo, gerando a responsabilidade objetiva. Quando não se faz distinção conceitual entre ilegalidade e improbidade, ocorre a aproximação da responsabilidade objetiva por infrações. Assim, ainda que demonstrada grave culpa, se não evidenciado o dolo específico de lesar os cofres públicos ou de obter vantagem indevida, bens tutelados pela Lei 8.429/1992, não se configura improbidade administrativa. REsp 1.193.248-MG, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, julgado em 24/4/2014.

Segunda Turma
DIREITO ADMINISTRATIVO. DIVERGÊNCIA ENTRE A ÁREA REGISTRADA E A MEDIDA PELOS PERITOS NO ÂMBITO DE DESAPROPRIAÇÃO PARA FINS DE REFORMA AGRÁRIA.
No procedimento de desapropriação para fins de reforma agrária, caso se constate que a área registrada em cartório é inferior à medida pelos peritos, o expropriado poderá levantar somente o valor da indenização correspondente à área registrada, devendo o depósito indenizatório relativo ao espaço remanescente ficar retido em juízo até que o expropriado promova a retificação do registro ou até que seja decidida, em ação própria, a titularidade do domínio. Essa é a interpretação que se extrai do art. 34, caput e parágrafo único, do Decreto-lei 3.365/1941, segundo o qual “O levantamento do preço será deferido mediante prova de propriedade, de quitação de dívidas fiscais que recaiam sobre o bem expropriado, e publicação de editais, com o prazo de 10 dias, para conhecimento de terceiros.” e “Se o juiz verificar que há dúvida fundada sobre o domínio, o preço ficará em depósito, ressalvada aos interessados a ação própria para disputá-lo”. Precedentes citados: REsp 1.321.842-PE, Segunda Turma, DJe 24/10/2013; REsp 596.300-SP, Segunda Turma, DJe 22/4/2008; e REsp 841.001-BA, Primeira Turma, DJ 12/12/2007. REsp 1.286.886-MT, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 6/5/2014.

DIREITO ADMINISTRATIVO. CONTRATAÇÃO TEMPORÁRIA DE SERVIDOR QUE JÁ POSSUIU CONTRATO COM ÓRGÃO DIVERSO.
É possível nova contratação temporária, também com fundamento na Lei 8.745/1993, precedida por processo seletivo equiparável a concurso público, para outra função pública e para órgão sem relação de dependência com aquele para o qual fora contratado anteriormente, ainda que a nova contratação tenha ocorrido em período inferior a 24 meses do encerramento do contrato temporário anterior. De fato, a vedação prevista no art. 9º, III, da Lei 8.745/1993, que proíbe nova contratação temporária do servidor antes de decorridos 24 meses do encerramento do contrato anterior celebrado com apoio na mesma lei, deve ser interpretada restritivamente, de acordo com a finalidade para qual foi criada, ou seja, impedir a continuidade do servidor temporário no exercício de funções públicas permanentes, em burla ao princípio constitucional que estabelece o concurso público como regra para a investidura em cargos públicos. Nesse sentido, na hipótese de contratação de servidor temporário para outra função pública, para outro órgão, sem relação de dependência com aquele para o qual fora contratado anteriormente, precedida por processo seletivo equiparável a concurso público, não se aplica a vedação do art. 9º, III, da Lei 8.745/1993, por referir-se a cargo distinto do que foi ocupado anteriormente. Assim, não deve incidir a referida restrição que, além de não estar abrangida no escopo da lei, implicaria ofensa ao princípio constitucional da igualdade de acesso aos cargos, funções e empregos públicos e da escolha do mais capacitado. Ademais, a elaboração de processo seletivo com características essenciais dos concursos públicos (publicidade, ampla concorrência e provas eliminatórias e classificatórias), diferenciando-se apenas pelo fato de que não concorriam a cargo público efetivo, mas mera contratação temporária, afasta a existência de motivo idôneo a justificar a não contratação do servidor. Precedente citado: REsp 503.823-MG, Quinta Turma, DJ 17/12/2007. REsp 1.433.037-DF, Rel. Min. Humberto Martins, julgado em 25/2/2014.

Terceira Turma
DIREITO CIVIL. PENA CONVENCIONAL E INDENIZAÇÃO POR PERDAS E DANOS.
Não se pode cumular multa compensatória prevista em cláusula penal com indenização por perdas e danos decorrentes do inadimplemento da obrigação. Enquanto a cláusula penal moratória manifesta com mais evidência a característica de reforço do vínculo obrigacional, a cláusula penal compensatória prevê indenização que serve não apenas como punição pelo inadimplemento, mas também como prefixação de perdas e danos. A finalidade da cláusula penal compensatória é recompor a parte pelos prejuízos que eventualmente decorram do inadimplemento total ou parcial da obrigação. Tanto assim que, eventualmente, sua execução poderá até mesmo substituir a execução do próprio contrato. Não é possível, pois, cumular cláusula penal compensatória com perdas e danos decorrentes de inadimplemento contratual. Com efeito, se as próprias partes já acordaram previamente o valor que entendem suficiente para recompor os prejuízos experimentados em caso de inadimplemento, não se pode admitir que, além desse valor, ainda seja acrescido outro, com fundamento na mesma justificativa – a recomposição de prejuízos. Ademais, nessas situações sobressaem direitos e interesses eminentemente disponíveis, de modo a não ter cabimento, em princípio, a majoração oblíqua da indenização prefixada pela condenação cumulativa em perdas e danos. REsp 1.335.617-SP, Rel. Min. Sidnei Beneti, julgado em 27/3/2014.

DIREITO PROCESSUAL CIVIL. UTILIZAÇÃO DA CONTADORIA JUDICIAL POR BENEFICIÁRIO DA ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA.
O beneficiário da assistência judiciária, ainda que seja representado pela Defensoria Pública, pode se utilizar do serviço de contador judicial para apuração do crédito que será objeto de execução, independentemente da complexidade dos cálculos.De fato, desde 1994, quando se deu a primeira fase da reforma do CPC, passou a ser ônus do próprio credor a apresentação da memória com os cálculos discriminados do valor a ser executado na hipótese em que a determinação do valor da condenação dependesse apenas de cálculos aritméticos (art. 604 do CPC com redação dada pela Lei 8.898/1994). A jurisprudência do STJ, ao interpretar o art. 604 do CPC, alterado pela reforma de 1994, já reconhecia que não fora excluída a possibilidade de o hipossuficiente valer-se dos serviços da contadoria judicial (EREsp 472.867-RS, Corte Especial, DJ de 4/10/2004). Posteriormente, a Lei 11.232/2005 alterou novamente o CPC, para estabelecer a fase de cumprimento das sentenças no processo de conhecimento e revogar dispositivos relativos à execução fundada em título judicial, dentre eles, o arts. 604 do CPC. Entretanto, manteve-se a sistemática que atribuía ao credor o ônus de apresentação da memória discriminada e atualizada do cálculo, quando a determinação do valor da condenação dependesse apenas de cálculos aritméticos. Ressalte-se que as reformas processuais em nenhum momento excluíram a possibilidade de utilização do contador judicial, mas apenas reduziram a sua esfera de atuação às hipóteses em que (i) a memória apresentada pelo credor aparentemente exceder os limites da decisão exequenda e (ii) nos casos de assistência judiciária (art. 475-B, § 3º, do CPC). Especificamente no que tange às hipóteses de assistência judiciária, é importante consignar que a finalidade da norma é claramente a de facilitação da defesa daquele credor que não tem condições financeiras de contratar profissional para realização dos cálculos sem comprometimento do seu sustento ou de sua família. Com efeito, a busca pela maior agilidade no processo judicial, por meio da transferência do ônus de elaboração dos cálculos àquele que tem interesse no recebimento do crédito e, portanto, no prosseguimento célere da execução, não pode prejudicar o hipossuficiente que antes já se valia dos serviços da contadoria judicial para liquidar o valor devido. Assim, embora o art. 3º da Lei 1.060/1950 disponha somente que a assistência judiciária gratuita compreende isenções de taxas judiciárias e dos selos, emolumentos e custas, despesas com publicação, indenizações devidas com testemunhas, honorários de advogados e peritos, não havendo previsão no sentido de que o Estado elaborará os cálculos dos exequentes que litigam sob o pálio da assistência judiciária, o CPC, no art. 475-B, § 3º, conferiu-lhes essa possibilidade. Além disso, o fato de o beneficiário da assistência judiciária ser representado pela Defensoria Pública não lhe retira a possibilidade utilizar-se dos serviços da contadoria judicial, pois não se pode presumir que a Defensoria Pública esteja ou deva estar aparelhada para a execução desses cálculos. Também não pode ser invocada a complexidade dos cálculos do valor da condenação como uma condição imprescindível para que os serviços do contador judicial possam ser utilizados, uma vez que o art. 475-B, § 3º, do CPC, ao permitir a utilização da contadoria, não faz essa exigência. Cabe ressaltar que, se o pedido fosse negado, representaria entrave para o amplo e integral acesso à tutela jurisdicional pelo beneficiário da assistência judiciária. Por fim, há que se fazer uma interpretação teleológica do referido benefício, bem como de caráter conforme a própria garantia prevista no art. 5º, LXXIV, da CF (“O Estado prestará assistência judiciária integral e gratuita aos que comprovarem a insuficiência de recursos”), a fim de lhe outorgar plena eficácia. REsp 1.200.099-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 6/5/2014.

Quarta Turma
DIREITO EMPRESARIAL E PROCESSUAL CIVIL. REPERCUSSÃO DA HOMOLOGAÇÃO DE PLANO DE RECUPERAÇÃO JUDICIAL.
A homologação do plano de recuperação judicial da devedora principal não implica extinção de execução de título extrajudicial ajuizada em face de sócio coobrigado. Com efeito, a novação disciplinada na Lei 11.101/2005 é muito diversa da novação prevista na lei civil. Se a novação civil faz, como regra, extinguir as garantias da dívida, inclusive as reais prestadas por terceiros estranhos ao pacto (art. 364 do CC), a novação decorrente do plano de recuperação judicial traz, como regra, a manutenção das garantias (art. 59,caput, da Lei 11.101/2005), sobretudo as reais, que só serão suprimidas ou substituídas “mediante aprovação expressa do credor titular da respectiva garantia” por ocasião da alienação do bem gravado (art. 50, § 1º, da Lei 11.101/2005). Além disso, a novação específica da recuperação judicial desfaz-se na hipótese de falência, quando então os “credores terão reconstituídos seus direitos e garantias nas condições originalmente contratadas” (art. 61, § 2º, da Lei 11.101/2005). O plano de recuperação judicial opera, portanto, uma novação sui generis e sempre sujeita a uma condição resolutiva, que é o eventual descumprimento do que ficou acertado no plano. Dessa forma, embora o plano de recuperação judicial opere novação das dívidas a ele submetidas, as garantias reais ou fidejussórias são, em regra, preservadas, circunstância que possibilita ao credor exercer seus direitos contra terceiros garantidores e impõe a manutenção das ações e execuções aforadas em face de fiadores, avalistas ou coobrigados em geral. Ressalte-se, ainda, que não haveria lógica no sistema se a conservação dos direitos e privilégios dos credores contra coobrigados, fiadores e obrigados de regresso (art. 49, § 1º, da Lei 11.101/2005) dissesse respeito apenas ao interregno temporal entre o deferimento da recuperação e a aprovação do plano, cessando esses direitos após a concessão definitiva com a homologação judicial. REsp 1.326.888-RS, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 8/4/2014.

Quinta Turma
DIREITO PENAL. REGIME INICIAL DE CUMPRIMENTO DE PENA NO CRIME DE TORTURA.
Não é obrigatório que o condenado por crime de tortura inicie o cumprimento da pena no regime prisional fechado. Dispõe o art. 1º, § 7º, da Lei 9.455/1997 – lei que define os crimes de tortura e dá outras providências – que “O condenado por crime previsto nesta Lei, salvo a hipótese do § 2º, iniciará o cumprimento da pena em regime fechado”. Entretanto, cumpre ressaltar que o Plenário do STF, ao julgar o HC 111.840-ES (DJe 17.12.2013), afastou a obrigatoriedade do regime inicial fechado para os condenados por crimes hediondos e equiparados, devendo-se observar, para a fixação do regime inicial de cumprimento de pena, o disposto no art. 33 c/c o art. 59, ambos do CP. Assim, por ser equiparado a crime hediondo, nos termos do art. 2º, caput e § 1º, da Lei 8.072/1990, é evidente que essa interpretação também deve ser aplicada ao crime de tortura, sendo o caso de se desconsiderar a regra disposta no art. 1º, § 7º, da Lei 9.455/1997, que possui a mesma disposição da norma declarada inconstitucional. Cabe esclarecer que, ao adotar essa posição, não se está a violar a Súmula Vinculante n.º 10, do STF, que assim dispõe: "Viola a cláusula de reserva de plenário (CF, art. 97) a decisão de órgão fracionário de tribunal que, embora não declare expressamente a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do poder público, afasta sua incidência, no todo ou em parte". De fato, o entendimento adotado vai ao encontro daquele proferido pelo Plenário do STF, tornando-se desnecessário submeter tal questão ao Órgão Especial desta Corte, nos termos do art. 481, parágrafo único, do CPC: "Os órgãos fracionários dos tribunais não submeterão ao plenário, ou ao órgão especial, a arguição de inconstitucionalidade, quando já houver pronunciamento destes ou do plenário do Supremo Tribunal Federal sobre a questão". Portanto, seguindo a orientação adotada pela Suprema Corte, deve-se utilizar, para a fixação do regime inicial de cumprimento de pena, o disposto no art. 33 c/c o art. 59, ambos do CP e as Súmulas 440 do STJ e 719 do STF. Confiram-se, a propósito, os mencionados verbetes sumulares: "Fixada a pena-base no mínimo legal, é vedado o estabelecimento de regime prisional mais gravoso do que o cabível em razão da sanção imposta, com base apenas na gravidade abstrata do delito." (Súmula 440 do STJ) e "A imposição do regime de cumprimento mais severo do que a pena aplicada permitir exige motivação idônea." (Súmula 719 do STF). Precedente citado: REsp 1.299.787-PR, Quinta Turma, DJe 3/2/2014. HC 286.925-RR, Rel. Min. Laurita Vaz, julgado em 13/5/2014.

DIREITO PROCESSUAL PENAL. COMPATIBILIDADE ENTRE A PRISÃO CAUTELAR E O REGIME PRISIONAL SEMIABERTO FIXADO NA SENTENÇA.
Há compatibilidade entre a prisão cautelar mantida pela sentença condenatória e o regime inicial semiaberto fixado nessa decisão, devendo o réu, contudo, cumprir a respectiva pena em estabelecimento prisional compatível com o regime inicial estabelecido. Precedentes citados: HC 256.535-SP, Quinta Turma, DJe 20/6/2013; e HC 228.010-SP, Quinta Turma, DJe 28/5/2013. HC 289.636-SP, Rel. Min. Moura Ribeiro, julgado em 20/5/2014.

Sexta Turma
DIREITO PENAL. ATIPICIDADE MATERIAL DA CONDUTA NO CRIME DE FURTO.
Aplica-se o princípio da insignificância à conduta formalmente tipificada como furto consistente na subtração, por réu primário, de bijuterias avaliadas em R$ 40 pertencentes a estabelecimento comercial e restituídas posteriormente à vítima. De início, há possibilidade de, a despeito da subsunção formal de um tipo penal a uma conduta humana, concluir-se pela atipicidade material da conduta, por diversos motivos, entre os quais a ausência de ofensividade penal do comportamento verificado. Vale lembrar que, em atenção aos princípios da fragmentariedade e da subsidiariedade, o Direito Penal apenas deve ser utilizado contra ofensas intoleráveis a determinados bens jurídicos e nos casos em que os demais ramos do Direito não se mostrem suficientes para protegê-los. Dessa forma, entende-se que o Direito penal não deve ocupar-se de bagatelas. Nesse contexto, para que o magistrado possa decidir sobre a aplicação do princípio da insignificância, faz-se necessária a ponderação do conjunto de circunstâncias que rodeiam a ação do agente para verificar se a conduta formalmente descrita no tipo penal afeta substancialmente o bem jurídico tutelado. Nessa análise, no crime de furto, avalia-se notadamente: a) o valor do bem ou dos bens furtados; b) a situação econômica da vítima; c) as circunstâncias em que o crime foi perpetrado, é dizer, se foi de dia ou durante o repouso noturno, se teve o concurso de terceira pessoa, sobretudo adolescente, se rompeu obstáculo de considerável valor para a subtração da coisa, se abusou da confiança da vítima etc.; e d) a personalidade e as condições pessoais do agente, notadamente se demonstra fazer da subtração de coisas alheias um meio ou estilo de vida, com sucessivas ocorrências (reincidente ou não). Assim, caso seja verificada a inexpressividade do comportamento do agente, fica afastada a intervenção do Direito Penal. Precedentes citados do STJ: AgRg no REsp 1.400.317-MG, Sexta Turma, DJe 13/12/2013; HC 208.770-RJ, Sexta Turma, DJe 12/12/2013. Precedentes citados do STF: HC 115.246-MG, Segunda Turma, DJe 26/6/2013; HC 109.134-RS, Segunda Turma, DJe 1º/3/2012. HC 208.569-RJ, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 22/4/2014.

DIREITO PENAL. TIPICIDADE DA CONDUTA NO CRIME DE PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO DE USO PERMITIDO.
É típica (art. 14 da Lei 10.826/2003) a conduta do praticante de tiro desportivo que transportava, municiada, arma de fogo de uso permitido em desacordo com os termos de sua guia de tráfego, a qual autorizava apenas o transporte de arma desmuniciada.De fato, as armas dos praticantes de tiro desportivo não integram rol dos “registros próprios” (art. 2º, § 1º, do Decreto 5.123/2004), ao menos para o fim de lhes ser deferido porte de arma. Dispõe, na verdade, sobre guia de tráfego (art. 30, § 1º, do referido Decreto 5.123/2004), licença distinta, a ser expedida pelo Comando do Exército. Poder-se-ia alegar que a restrição de se ter que trafegar com a arma desmuniciada não constaria de lei ou regulamento, daí ser ela inócua mesmo que o Exército tenha expedido a guia com essa menção. Todavia, o legislador foi extremamente cuidadoso ao consignar, claramente, na Lei 10.826/2003, em seu art. 6º, que é "proibido o porte de arma de fogo em todo o território nacional", seguindo-se as ressalvas. Em relação aos atiradores, foi autorizado o porte apenas no momento em que a competição é realizada. Nos indispensáveis trajetos para os estandes de tiro não se deferiu porte, mas específica guia de tráfego. Daí, a necessidade de cautelas no transporte. Nesse contexto, em consideração ao fato de que a prática esportiva de tiro é atividade que conta com disciplina legal, é plenamente possível o traslado de arma de fogo para a realização de treinos e competições, exigindo-se, porém, além do registro, a expedição de guia de tráfego (que não se confunde com o porte de arma) e respeito aos termos desta autorização. Não concordando com os termos da guia, a lealdade recomendaria que o praticante de tiro desportivo promovesse as medidas jurídicas cabíveis para eventualmente modificá-la, e não simplesmente que saísse com a arma municiada, ao arrepio do que vem determinando a autoridade competente sobre a matéria, o Exército. RHC 34.579-RS, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 24/4/2014.

DIREITO PENAL. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA NO CASO DE CRIMES RELACIONADOS A TRIBUTOS QUE NÃO SEJAM DA COMPETÊNCIA DA UNIÃO.
É inaplicável o patamar estabelecido no art. 20 da Lei 10.522/2002, no valor de R$ 10 mil, para se afastar a tipicidade material, com base no princípio da insignificância, de delitos concernentes a tributos que não sejam da competência da União. De fato, o STJ, por ocasião do julgamento do REsp 1.112.748-TO, Terceira Seção, DJe 13/10/2009, submetido à sistemática do art. 543-C do CPC, consolidou o entendimento de que deve ser aplicado o princípio da insignificância aos crimes referentes a débitos tributários que não excedam R$ 10 mil, tendo em vista o disposto no art. 20 da Lei 10.522/2002. Contudo, para a aplicação desse entendimento aos delitos tributários concernentes a tributos que não sejam da competência da União, seria necessária a existência de lei do ente federativo competente, porque a arrecadação da Fazenda Nacional não se equipara à dos demais entes federativos. Ademais, um dos requisitos indispensáveis à aplicação do princípio da insignificância é a inexpressividade da lesão jurídica provocada, que pode se alterar de acordo com o sujeito passivo, situação que reforça a impossibilidade de se aplicar o referido entendimento de forma indiscriminada à sonegação dos tributos de competência dos diversos entes federativos. Precedente citado: HC 180.993-SP, Quinta Turma, DJe 19/12/2011. HC 165.003-SP, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 20/3/2014.

DIREITO PENAL MILITAR. TIPICIDADE DA CONDUTA NO CRIME DE DESCUMPRIMENTO DE MISSÃO.
A ausência injustificada nos dias em que o militar tenha sido designado para a função específica de comando de patrulhas configura o crime de descumprimento de missão. De acordo com o art. 196 do CPM, é típica a conduta de “deixar o militar de desempenhar a missão que lhe foi confiada”. O crime de descumprimento de missão está previsto no capítulo de crimes em serviço, e a missão, aqui, deve ser entendida como incumbência, tarefa designada ao militar. A missão confiada não deixa de ser serviço e, conforme entendimento doutrinário, trata-se de incumbência de maior relevância, de caráter intuitu personae e na qual o sujeito ativo deveria representar seu superior hierárquico. Essa interpretação é condizente com a ordem jurídica militar, norteada pela hierarquia e disciplina, e que objetiva a proteção especial dos interesses do Estado e das instituições militares. Nesse contexto, deve-se considerar que o comando de força patrulha consiste verdadeira longa manus do comandante na fiscalização das diretrizes baixadas pelo próprio Comando. Com esse encargo, o militar recebe verdadeira missão, mais especificamente, a de comandar todo o efetivo na atividade operacional. REsp 1.301.155-SP, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 22/4/2014.

DIREITO PROCESSUAL PENAL. INAPLICABILIDADE DO PRINCÍPIO DA INDIVISIBILIDADE EM AÇÃO PÚBLICA.
Na ação penal pública, o MP não está obrigado a denunciar todos os envolvidos no fato tido por delituosonão se podendo falar em arquivamento implícito em relação a quem não foi denunciadoIsso porque, nessas demandas, não vigora o princípio da indivisibilidade. Assim, o Parquet é livre para formar sua convicção incluindo na increpação as pessoas que entenda terem praticados ilícitos penais, mediante a constatação de indícios de autoria e materialidade. Ademais, há possibilidade de se aditar a denúncia até a sentença. Precedentes citados: REsp 1.255.224-RJ, Quinta Turma, DJe 7/3/2014; APn 382-RR, Corte Especial, DJe 5/10/2011; e RHC 15.764-SP, Sexta Turma, DJ 6/2/2006. RHC 34.233-SP, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 6/5/2014.

DIREITO PROCESSUAL PENAL. PODERES DO RELATOR EM INVESTIGAÇÃO CONTRA MAGISTRADO.
O prosseguimento da investigação criminal em que surgiu indício da prática de crime por parte de magistrado não depende de deliberação do órgão especial do tribunal competente, cabendo ao relator a quem o inquérito foi distribuído determinar as diligências que entender cabíveis. O parágrafo único do art. 33 da LOMAN (“Quando, no curso de investigação, houver indício da prática de crime por parte de magistrado, a autoridade policial, civil ou militar, remeterá os respectivos autos ao Tribunal ou órgão especial competente para o julgamento, a fim de que prossiga na investigação”) não autoriza concluir, pelo seu conteúdo normativo, ser necessária a submissão do procedimento investigatório ao órgão especial tão logo chegue ao tribunal competente, para que seja autorizado o prosseguimento do inquérito. Trata-se, em verdade, de regra de competência. No tribunal, o inquérito é distribuído ao relator, a quem cabe determinar as diligências que entender cabíveis para realizar a apuração, podendo chegar, inclusive, ao arquivamento. Cabe ao órgão especial receber ou rejeitar a denúncia, conforme o caso, sendo desnecessária a sua autorização para a instauração do inquérito judicial, segundo a jurisprudência do STF. Precedente citado do STF: HC 94.278-SP, Tribunal Pleno, DJ 28/11/2008. HC 208.657-MG, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 22/4/2014.


FONTE - STJ

29/05/2014, quinta-feira

STF considera inconstitucional exigência de garantia para impressão de documentos fiscais

Por decisão unânime, os ministros do STF deram provimento a recurso com repercussão geral reconhecida, considerando inconstitucional norma que exigia a prestação de garantia para impressão de documentos fiscais.

20:40 - Câmara questiona resolução do TSE sobre número de deputados federais e estaduais
20:30 - STF considera inconstitucional exigência de garantia para impressão de documentos fiscais
19:40 - Julgadas inconstitucionais normas do DF sobre ascensão de servidores
19:35 - Programação da Rádio Justiça para sexta-feira (30)
19:00 - Pedido de vista suspende análise de RE sobre efeitos da transação penal
18:55 - SP não sofrerá restrição cadastral por inadimplência da Fundação Pró-Sangue
18:45 - Improcedente acusação contra deputado por dispensa ilegal de licitação
16:30 - Ministro Joaquim Barbosa anuncia sua saída do STF
15:10 - Direto do Plenário: Ministro Joaquim Barbosa anuncia aposentadoria
08:00 - Pauta de julgamentos para a sessão plenária desta quinta-feira (29)

FONTE - STF

28/05/2014, quarta-feira

Plenário determina realização de diligências em processos sobre planos econômicos

Ministros acolhem pedido da PGR para realizar nova análise da questão, diante da informação prestada pela União no sentido de que haveriam erros em perícias realizadas nos autos.

20:40 - STF determina apreciação de regime semiaberto para estrangeiro condenado no Brasil
20:05 - STF julga inconstitucional lei fluminense sobre contratos temporários 
19:30 - Programação da Rádio Justiça para quinta-feira (29)
19:20 - Suspensa decisão que determinou nomeação de cadastro de reserva da PM-AL
18:25 - STF aprova emenda regimental que acrescenta competências às Turmas 
18:20 - Julgada válida exigência de um ano de registro para partidos participarem de eleições
17:55 - Ministra nega seguimento a reclamação do Estado de Sergipe sobre terceirização
16:00 - Plenário determina realização de diligências em processos sobre planos econômicos 

FONTE - SRF

27/05/2014, terça-feira

Pauta de julgamentos previstos para a sessão plenária desta quarta-feira (28)

Entre os processos pautados, Plenário do STF deve analisar ações que discutem diferenças de correção monetária de depósitos em caderneta de poupança em razão de planos econômicos.

20:45 - Programação da Rádio Justiça para quarta-feira (28)
20:30 - Pauta de julgamentos previstos para a sessão plenária desta quarta-feira (28)
18:45 - 1ª Turma: cabe à Justiça Federal julgar ação de policiais civis do DF
18:05 - 1ª Turma extingue HC de servidora acusada de agredir militar
17:30 - Rejeitado MS que questionava decisão do CNJ sobre remoção de juízes
17:00 - Inscrições para o Prêmio Innovare encerram-se no dia 31
16:45 - 1ª Turma concede extradição de paraguaio investigado por homicídio 
16:30 - Rejeitada ação do PT que questiona impedimento ao trabalho externo
15:50 - Negado HC que questionava ato de expulsão de estrangeiro 

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FONTE - STF

sexta-feira, 16 de maio de 2014

STF INFORMATIVO Nº 743

Informativo STF

Brasília, 21 a 25 de abril de 2014 - Nº 743.

Este Informativo, elaborado a partir de notas tomadas nas sessões de julgamento das Turmas e do Plenário, contém resumos não-oficiais de decisões proferidas pelo Tribunal. A fidelidade de tais resumos ao conteúdo efetivo das decisões, embora seja uma das metas perseguidas neste trabalho, somente poderá ser aferida após a sua publicação no Diário da Justiça.


SUMÁRIO


Plenário
Art. 170 da Lei 8.112/1990: registro de infração prescrita e presunção de inocência
Aplicação de penalidade administrativa e autoridade competente - 1
Aplicação de penalidade administrativa e autoridade competente - 2
Ação penal: juízo absolutório e prescrição - 1
Ação penal: juízo absolutório e prescrição - 2
Ação penal: juízo absolutório e prescrição - 3
Repercussão Geral
Contribuição sobre serviços prestados por cooperados por intermédio de cooperativas
1ª Turma
Infrações autônomas e princípio da consunção
2ª Turma
Lei 5.836/1972: Conselho de Justificação e princípio da ampla defesa e contraditório
Repercussão Geral
Clipping do DJe
Transcrições
Procurador do Estado - Atividade de Consultoria Jurídica - Exclusividade - Advocacia de Estado (CF, art. 132) (ADI 4.843-MC/PB)
Inovações Legislativas
Outras Informações


PLENÁRIO

Art. 170 da Lei 8.112/1990: registro de infração prescrita e presunção de inocência

O art. 170 da Lei 8.112/1990 (“Extinta a punibilidade pela prescrição, a autoridade julgadora determinará o registro do fato nos assentamentos individuais do servidor”) é inconstitucional. Essa a conclusão do Plenário ao conceder mandado de segurança para cassar decisão do Presidente da República que, embora reconhecendo a prescrição da pretensão punitiva de infração disciplinar praticada pelo impetrante, determinara a anotação dos fatos apurados em assentamento funcional. O Tribunal asseverou que, em virtude do reconhecimento da extinção da punibilidade pela prescrição, obstar-se-ia a imposição de punição administrativo-disciplinar, tendo em conta que a pretensão punitiva da Administração estaria comprometida de modo direto e imediato. Assim, afirmou que a anotação dessa ocorrência em ficha funcional violaria o princípio da presunção de inocência. Em consequência, a Corte, por maioria, declarou a inconstitucionalidade incidental do art. 170 da Lei 8.112/1990. O Ministro Dias Toffoli (relator) aduziu que o mencionado dispositivo remontaria prática surgida, em especial, na Formulação 36 do extinto Departamento de Administração do Serviço Público - DASP (“Se a prescrição for posterior à instauração do inquérito, deve-se registrar nos assentamentos do funcionário a prática da infração apenada”). O Ministro Luiz Fux salientou que o registro, em si, seria uma punição, que acarretaria efeitos deletérios na carreira do servidor, em ofensa também ao princípio da razoabilidade. O Ministro Marco Aurélio realçou, de igual forma, que o aludido artigo discreparia da Constituição sob o ângulo da razoabilidade. Por sua vez, o Ministro Ricardo Lewandowski acrescentou que o preceito em questão atentaria contra a imagem funcional do servidor. Vencido o Ministro Teori Zavascki, que não reputava o art. 170 da Lei 8.112/1990 inconstitucional. Consignava que a incompatibilidade dependeria da interpretação conferida ao dispositivo. Aduzia não conflitar com a Constituição o entendimento de que se trataria de documentação de um fato, ou seja, de que o servidor respondera a um processo e que a ele não fora aplicada pena em razão da prescrição.
MS 23262/DF, rel. Min. Dias Toffoli, 23.4.2014. (MS-23262)



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Aplicação de penalidade administrativa e autoridade competente - 1

O Plenário, por maioria, concedeu mandado de segurança para declarar a insubsistência de penalidade de suspensão aplicada pelo Presidente do STF à servidora pública do respectivo tribunal. No caso, a impetrante cometera infração administrativa e, em consequência, fora-lhe imposta pela Presidência do STF — ao acolher parecer da assessoria jurídica, endossado pelo Diretor-Geral — pena de 60 dias de suspensão. De início, o Colegiado afastou a assertiva de violação ao contraditório e à ampla defesa em decorrência de a impetrante não ter sido ouvida durante a confecção do referido parecer. Registrou que o envio do processo à Presidência ocorrera em virtude da observância do que disposto no Regulamento da Secretaria do Supremo Tribunal Federal. Constatou, ademais, que não se estabeleceria contraditório entre a atividade de consultoria interna prestada no âmbito da Administração, que teria por objetivo fornecer subsídios jurídicos à autoridade competente para decidir, e o eventual interessado no procedimento. Na sequência, ressaltou que o art. 141, I e II, da Lei 8.112/1990 expressamente excluiria da esfera de atribuições da presidência dos tribunais federais a aplicação de penalidades que não fossem de demissão, cassação de aposentadoria ou disponibilidade de servidor vinculado ao respectivo Poder, órgão ou entidade [“Art. 141. As penalidades disciplinares serão aplicadas: I - pelo Presidente da República, pelos Presidentes das Casas do Poder Legislativo e dos Tribunais Federais e pelo Procurador-Geral da República, quando se tratar de demissão e cassação de aposentadoria ou disponibilidade de servidor vinculado ao respectivo Poder, órgão, ou entidade; II - pelas autoridades administrativas de hierarquia imediatamente inferior àquelas mencionadas no inciso anterior quando se tratar de suspensão superior a 30 (trinta) dias”]. A Corte consignou haver discrepância entre a previsão da Lei 8.112/1990, quanto à aplicação de punições disciplinares, e o disposto no art. 65, IX, n, do Regulamento da Secretaria do STF, que limita a suspensão de servidores pelo Diretor-Geral ao prazo máximo 30 dias [“Art. 65. Além das fixadas no Regimento Interno, são atribuições do Diretor-Geral da Secretaria: ... IX - praticar atos de gestão de pessoal, administrativa, orçamentária, financeira e patrimonial, a saber: ... n) elogiar servidores e aplicar penas disciplinares de advertência e de suspensão até trinta dias, submetendo ao Presidente aquelas que excederem a esse período”]. Destacou que o descompasso entre o regulamento administrativo e a lei resolver-se-ia em favor desta última.
MS 28033/DF, rel. Min. Marco Aurélio, 23.4.2014. (MS-28033)



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Aplicação de penalidade administrativa e autoridade competente - 2

O Tribunal afirmou que o princípio da legalidade exigiria plena submissão da atividade administrativa ao estabelecido em lei. Além disso, aduziu que esse princípio seria garantia de o administrado não ser submetido a arbitrariedades. Sublinhou que o princípio hierárquico, que regeria as relações internas da Administração, não se sobreporia ao da legalidade, mas nele estaria contido. Ponderou que a hierarquia encontraria fundamento e limites na letra da lei. Enfatizou que, segundo a jurisprudência do STF, o art. 5º, LV, da CF consagraria o direito ao duplo grau administrativo, independentemente de depósito prévio de valores. Asseverou que a manutenção do ato impugnado contrariaria esse entendimento. Vencidos os Ministros Roberto Barroso, Luiz Fux e Ricardo Lewandowski, que denegavam o mandado de segurança. Pontuavam que a aplicação da penalidade pelo Presidente do STF não macularia o processo administrativo, tendo em conta a possibilidade de a mencionada autoridade exercer a avocação. Por fim, o Ministro Marco Aurélio (relator) declarou a inconstitucionalidade da expressão “até trinta dias, submetendo ao Presidente aquelas que excederem a esse período”, contida na alínea n do inciso IX do artigo 65 do Regulamento da Secretaria do Supremo. Por outro lado, os Ministros Teori Zavascki e Cármen Lúcia reputaram que a questão resolver-se-ia no campo da legalidade. O Ministro Dias Toffoli, por sua vez, entendeu desnecessária a declaração de inconstitucionalidade, pois o referido regulamento poderia ser alterado em sessão administrativa. O Ministro Celso de Mello salientou que o conflito hierárquico normativo permitiria ao STF, em sede mandamental, afastar a aplicabilidade da norma prevista no regulamento — em observância ao princípio da estrita legalidade —, de modo a incidir a norma legal. Contudo, não se alcançou o quórum para a declaração de inconstitucionalidade. Precedente citado: RE 388.359/PE (DJU de 28.3.2007).
MS 28033/DF, rel. Min. Marco Aurélio, 23.4.2014. (MS-28033)

Ação penal: juízo absolutório e prescrição - 1

O Tribunal, por maioria, julgou improcedente pedido formulado em ação penal para absolver senador — acusado da suposta prática de falsidade ideológica, corrupção passiva e peculato (CP, artigos 299, 317 e 312, respectivamente) — com fulcro no art. 386, VII, do CPP (“Art. 386.  O juiz absolverá o réu, mencionando a causa na parte dispositiva, desde que reconheça: ... VII - não existir prova suficiente para a condenação”). Preliminarmente, o Colegiado afastou assertiva de inépcia da denúncia, tendo em vista que as condutas estariam devidamente individualizadas e os fatos criminosos estariam suficientemente expostos, ainda que de forma precária. Assim, não haveria razão para trancamento da ação penal. Rejeitou, ademais, alegado cerceamento de defesa decorrente de falta de oportunidade para apresentação de resposta preliminar. A defesa sustentava que se trataria de crimes funcionais típicos, próprios de funcionário público no exercício da função. O Plenário anotou, entretanto, que, à época do recebimento da denúncia, o réu não mais deteria a qualidade de funcionário público, portanto seria dispensável a adoção da regra do art. 514 do CPP. A Corte rejeitou, também em preliminar, alegações de cerceamento de defesa ocasionadas por indeferimento de diligências e por falta de exame de corpo de delito. A respeito, salientou que essas providências teriam sido fundamentadamente indeferidas. No mérito, prevaleceu o voto da Ministra Cármen Lúcia (relatora). Explicou que os autos referir-se-iam a suposto esquema de corrupção durante o governo do réu, então Presidente da República, em que haveria distribuição de benesses com dinheiro público, advindo de contratos de publicidade governamental. O Tribunal aduziu que o pedido condenatório baseara-se principalmente em depoimentos de corréus e de informante, que apresentaram, na fase policial, versões colidentes com a denúncia. Destacou, entretanto, que nenhuma dessas versões seria suficiente para vincular o réu às condutas criminosas a ele imputadas. Lembrou que delação de corréu e depoimento de informante não poderiam servir como elementos decisivos para a condenação, porque não seria exigido o compromisso legal de falar a verdade. Nesses casos, esses elementos probatórios poderiam servir apenas de substrato para a denúncia, conforme precedentes do STF. Consignou que mesmo a confissão em juízo, que, diversamente da delação, constituiria meio de prova direto, deveria ser confrontada com as demais provas processuais. Ponderou que, nos limites dos autos, não haveria provas suficientes para a condenação, a qual exigiria a certeza dos fatos e de sua autoria.
AP 465/DF, rel. Min. Cármen Lúcia, 24.4.2014. (AP-465)



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Ação penal: juízo absolutório e prescrição - 2

A relatora frisou, ademais, que os crimes de falsidade ideológica e de corrupção passiva estariam atingidos pela prescrição. Todavia, diante da peculiaridade do caso, considerou que seria necessário analisar o mérito quanto aos três tipos penais em questão, tendo em conta a imbricação dos fatos. Salientou que a jurisprudência da Corte seria orientada no sentido de que, remanescente um dos crimes sob julgamento, deveria ser analisado o conjunto fático-jurídico como um todo, a partir do qual estaria motivada a acusação. Sublinhou que, se prevalecesse entendimento pela condenação, assentar-se-ia a prescrição da pretensão punitiva quanto à falsidade e à corrupção. Por outro lado, destacou que eventual sentença absolutória seria mais favorável do que o registro da prescrição. O Ministro Roberto Barroso considerou que, nas hipóteses em que finda a instrução, seria facultado ao juiz reconhecer a prescrição ou absolver — embora não seja direito subjetivo da parte —, exceto na eventualidade de vir a ser proferida decisão condenatória, situação na qual necessário assentar a prescrição. Ressalvou que, se a extinção da punibilidade pelo reconhecimento da prescrição fosse atestada em fases iniciais do processo, o magistrado teria a prerrogativa de extingui-lo. No ponto, o Ministro Luiz Fux explicitou que seria mais condizente com a dignidade da pessoa humana conferir ao julgador a possibilidade de proferir sentença absolutória ao invés de declarar a prescrição.
AP 465/DF, rel. Min. Cármen Lúcia, 24.4.2014. (AP-465)

Ação penal: juízo absolutório e prescrição - 3

Vencido, parcialmente, o Ministro Ricardo Lewandowski, que enquadrava a absolvição no art. 386, V, do CPP (“V - não existir prova de ter o réu concorrido para a infração penal”). Asseverava que esse fundamento seria mais preciso e benéfico. Vencidos, também em parte, os Ministros Teori Zavascki, Rosa Weber e Joaquim Barbosa (Presidente), que reconheciam a prescrição da pretensão punitiva em relação aos delitos de falsidade ideológica e de corrupção passiva. O Ministro Teori Zavascki anotava que, verificada a prescrição em abstrato, como na espécie, a análise do mérito ficaria prejudicada, e seria dever do magistrado decretar, de ofício, a extinção da punibilidade. Reputava que a pretensão punitiva, quando extinta pela prescrição, levaria a situação idêntica à da anistia, o que seria mais forte do que a absolvição. Alertava que, se adotada a tese de que o juízo absolutório seria mais benéfico e, portanto, necessário, inviabilizar-se-ia o conhecimento da prescrição em abstrato, o que imporia, em todos os casos, o julgamento de mérito para, posteriormente, se declarar prescrita a pretensão punitiva. A Ministra Rosa Weber acrescia que o fundamento adotado para a absolvição, qual seja, a inexistência de prova suficiente para se condenar, seria menos favorável do que a extinção da punibilidade pela prescrição. O Presidente destacava que a opção pela apreciação do mérito, nas hipóteses em que já atingido o prazo prescricional, geraria insegurança, pois o réu permaneceria sujeito ao risco de um julgamento.
AP 465/DF, rel. Min. Cármen Lúcia, 24.4.2014. (AP-465)


REPERCUSSÃO GERAL

Contribuição sobre serviços prestados por cooperados por intermédio de cooperativas

É inconstitucional a contribuição a cargo de empresa, destinada à seguridade social, no montante de “quinze por cento sobre o valor bruto da nota fiscal ou fatura de prestação de serviços, relativamente a serviços que lhe são prestados por cooperados por intermédio de cooperativas de trabalho”, prevista no art. 22, IV, da Lei 8.212/1991, com a redação dada pela Lei 9.876/1999. Com base nessa orientação, o Plenário deu provimento a recurso extraordinário no qual se discutia a obrigação de recolhimento da exação. Na espécie, o tribunal “a quo” entendera ser possível a fixação da mencionada alíquota via lei ordinária. Decidira, ainda, pela validade da equiparação da cooperativa à empresa mercantil, que ampliara o rol dos sujeitos passivos das contribuições sociais. A Corte, de início, salientou que a Lei 9.876/1999 transferira a sujeição passiva da obrigação tributária para as empresas tomadoras dos serviços. Em seguida, assentou que, embora os sócios/usuários pudessem prestar seus serviços no âmbito dos respectivos locais de trabalho, com seus equipamentos e técnicas próprios, a prestação dos serviços não seria dos sócios/usuários, mas da sociedade cooperativa. Apontou que os terceiros interessados nesses serviços efetuariam os pagamentos diretamente à cooperativa, que se ocuparia, posteriormente, de repassar aos sócios/usuários as parcelas relativas às respectivas remunerações. O colegiado aduziu que a tributação de empresas, na forma delineada na Lei 9.876/1999, mediante desconsideração legal da personalidade jurídica das sociedades cooperativas, subverteria os conceitos de pessoa física e de pessoa jurídica estabelecidos pelo direito privado. Reconheceu que a norma teria extrapolado a base econômica delineada no art. 195, I, a, da CF, ou seja, a regra sobre a competência para se instituir contribuição sobre a folha de salários ou sobre outros rendimentos do trabalho. Reputou afrontado o princípio da capacidade contributiva (CF, art. 145, § 1º), porque os pagamentos efetuados por terceiros às cooperativas de trabalho, em face de serviços prestados por seus associados, não se confundiriam com os valores efetivamente pagos ou creditados aos cooperados. Sublinhou que o legislador ordinário, ao tributar o faturamento da cooperativa, descaracterizara a contribuição hipoteticamente incidente sobre os rendimentos do trabalho dos cooperados, com evidente “bis in idem”. Assim, o Tribunal concluiu que contribuição destinada a financiar a seguridade social, que tivesse base econômica estranha àquelas indicadas no art. 195 da CF, somente poderia ser legitimamente instituída por lei complementar, nos termos do art. 195, § 4º, da CF.
RE 595838/SP, rel. Min. Dias Toffoli, 23.4.2014. (RE-595838)



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PRIMEIRA TURMA

Infrações autônomas e princípio da consunção

Crime tipificado no Código Penal não pode ser absorvido por infração descrita na Lei de Contravenções Penais. Com base nessa orientação, a 1ª Turma denegou “habeas corpus” para refutar a incidência do princípio da consunção. Na espécie, a impetração pleiteava que o crime de uso de documento falso (CP, art. 304) fosse absorvido pela contravenção penal de exercício ilegal da profissão ou atividade econômica (LCP, art. 47). A Turma aduziu, ainda, que o crime de uso de documento falso praticado pelo paciente não fora meio necessário nem fase para consecução da infração de exercício ilegal da profissão.
HC 121652/SC, rel. Min. Dias Toffoli, 22.4.2014. (HC-121652)


SEGUNDA TURMA

Lei 5.836/1972: Conselho de Justificação e princípio da ampla defesa e contraditório

A 2ª Turma negou provimento a recurso ordinário em mandado de segurança em que se alegava nulidade, por ofensa ao princípio da ampla defesa e contraditório, de ato administrativo que homologara julgamento realizado pelo Conselho de Justificação e encaminhara os autos ao STM. No caso, o recorrente fora submetido ao Conselho de Justificação, órgão destinado a avaliar, por meio de processo especial, a incapacidade de oficial das Forças Armadas para permanecer na ativa. A Turma observou que o STM seria competente para julgar o referido processo administrativo, consoante o disposto nos artigos 13, V, a, e 14 da Lei 5.836/1972 [“Art. 13. Recebidos os autos do processo do Conselho de Justificação, o Ministro Militar, dentro do prazo de 20 (vinte) dias, aceitando ou não seu julgamento e, neste último caso, justificando os motivos de seu despacho, determina: ... V - a remessa do processo ao Superior Tribunal Militar: a) se a razão pela qual o oficial foi julgado culpado está previsto nos itens I, III e V do artigo 2º... Art. 14. É da competência do Superior Tribunal Militar julgar, em instância única, os processos oriundos de Conselhos de Justificação, a ele remetidos por Ministro Militar”]. Destacou não haver previsão legal de recurso contra o despacho de comandante militar que aceitasse o julgamento do Conselho de Justificação — comissão processante — e determinasse a remessa do processo ao STM, que atuaria, nessa hipótese, como órgão administrativo. Além disso, sublinhou que o despacho proferido pelo comandante resumir-se-ia a homologar a decisão da comissão e a determinar a remessa obrigatória dos autos ao STM. Asseverou que, após a homologação, a esfera de competência do comandante estaria esgotada. A Turma enfatizou, ademais, que o art. 15 da Lei 5.836/1972 garantiria ao ora recorrente o direito à ampla defesa e ao contraditório, uma vez que determinaria, após a distribuição do processo e antes de seu julgamento pelo STM, a abertura de prazo de cinco dias para a defesa se manifestar por escrito sobre a decisão do Conselho de Justificação. Afirmou que não seria aplicável à espécie o Decreto 76.322/1975 e as Leis 6.880/1980 e 9.784/1999, uma vez que a Lei 5.836/1972, que dispõe sobre o Conselho de Justificação, seria específica. Por fim, no que se refere à alegação de que haveria vícios que maculariam o processo administrativo e permitiriam declarar o impetrante justificado, reputou que essa assertiva deveria ser apreciada no âmbito do STM, pois não aproveitaria ao recorrente, uma vez que, na espécie, discutir-se-ia a legalidade do imediato envio dos autos ao STM, em momento anterior à publicação da decisão do Conselho de Justificação.
RMS 32645/DF, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 22.4.2014. (RMS-32645)


SessõesOrdináriasExtraordináriasJulgamentos
Pleno23.4.201424.4.20145
1ª Turma22.4.2014135
2ª Turma22.4.2014140



R E P E R C U S S Ã O  G E R A L

DJe de 21 a 25 de abril de 2014

REPERCUSSÃO GERAL EM RE N. 698.531-ES
RELATOR: MIN. MARCO AURÉLIO
REPERCUSSÃO GERAL – PIS – EMPRÉSTIMO E AQUISIÇÃO DE MÁQUINAS E EQUIPAMENTOS JUNTO A PESSOA JURÍDICA ESTRANGEIRA – DESPESAS – EXCLUSÃO DA BASE DE CÁLCULO – ARTIGO 3º, INCISOS I E II, DA LEI Nº 10.637/2002 – VEDAÇÃO – ISONOMIA TRIBUTÁRIA E PROIBIÇÃO DE DISCRIMINAÇÃO EM RAZÃO DA PROCEDÊNCIA DE BENS E SERVIÇOS. Possui repercussão geral a controvérsia acerca da eventual ofensa aos artigos 150, inciso II, e 152 da Constituição de 1988 por disciplina legal restritiva de créditos da contribuição ao PIS, na sistemática não cumulativa, consideradas operações de empréstimo e aquisição de máquinas e equipamentos com pessoas jurídicas estrangeiras.

REPERCUSSÃO GERAL EM ARE N. 784.682-MG
RELATOR: MIN. MARCO AURÉLIO
REPERCUSSÃO GERAL – IPVA – LOCAL DE RECOLHIMENTO –  ARTIGOS 146, INCISOS I E III, E 155, INCISO III, DA CARTA DA REPÚBLICA. Possui repercussão geral a controvérsia acerca do local a ser pago o Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores – IPVA, se em favor do estado no qual se encontra sediado ou domiciliado o contribuinte ou onde registrado e licenciado o veículo automotor cuja propriedade constitui fato gerador do tributo.

REPERCUSSÃO GERAL EM ARE N. 787.379-PE
RELATOR: MIN. TEORI ZAVASCKI
EMENTA: PROCESSUAL CIVIL. RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. TRABALHADOR RURAL. SEGURO-SAFRA. PESCADOR ARTESANAL. SEGURO-DEFESO. ISONOMIA. MATÉRIA INFRACONSTITUCIONAL. AUSÊNCIA DE REPERCUSSÃO GERAL.
1. A controvérsia relativa à possibilidade de recebimento, pelos trabalhadores rurais, do seguro-desemprego concedido aos pescadores artesanais é de natureza infraconstitucional, já que decidida pela Turma Recursal de origem à luz das Leis 8.287/90, 10.420/2002 e 10.779/2003, não havendo, portanto, matéria constitucional a ser analisada.
2. Não houve emissão, pelo acórdão recorrido, de juízo acerca das matérias de que tratam as normas insertas nos arts. 1º, III, 3º, III e IV, 5º, XXXV, 6º, 7º, II, 194, parágrafo único, I, 195, § 8º, e 201, III, da Constituição Federal, tampouco as questões foram suscitadas no momento oportuno, em sede dos embargos de declaração. Aplica-se, ao caso, o óbice das súmulas 282 e 356 do STF.
3. Com relação à inconstitucionalidade do art. 5º, XXXV, da CF, a parte recorrente não apontou, nas suas razões recursais, os dispositivos constitucionais tidos por violados. Aplicação do óbice da Súmula 284/STF.
4. Incabível, em recurso extraordinário, apreciar violação ao art. 5º, XXXV, da Constituição Federal, em razão de necessidade de revisão da interpretação das normas infraconstitucionais pertinentes (AI 796.905-AgR/PE, Rel. Min. LUIZ FUX, Primeira Turma, DJe de 21.5.2012; AI 622.814-AgR/PR, Rel. Min. DIAS TOFFOLI, Primeira Turma, DJe de 08.3.2012; ARE 642.062-AgR/RJ, Rel. Min. ELLEN GRACIE, Segunda Turma, DJe de 19.8.2011).
5. É cabível a atribuição dos efeitos da declaração de ausência de repercussão geral quando não há matéria constitucional a ser apreciada ou quando eventual ofensa à Constituição Federal se dê de forma indireta ou reflexa (RE 584.608 RG, Min. ELLEN GRACIE, Pleno, DJe de 13/03/2009).
6. Ausência de repercussão geral da questão suscitada, nos termos do art. 543-A do CPC.

Decisões Publicadas: 3



C L I P P I N G  D O  D J E

21 a 25 de abril de 2014

EMB. DECL. NO AG. REG. NO RE N. 733.596-MA
RELATOR: MIN. LUIZ FUX
EMENTA: EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO. CONTRATAÇÃO PRECÁRIA DURANTE PRAZO DE VALIDADE DO CERTAME. PRETERIÇÃO CARACTERIZADA. EXPECTATIVA DE DIREITO CONVOLADA EM DIREITO SUBJETIVO À NOMEAÇÃO. PRECEDENTE. OMISSÃO. INEXISTÊNCIA. EFEITOS INFRINGENTES. IMPOSSIBILIDADE. DESPROVIMENTO.
1. A omissão, contradição ou obscuridade, quando inocorrentes, tornam inviável a revisão em sede de embargos de declaração, em face dos estreitos limites do art. 535 do CPC.
2. O magistrado não está obrigado a rebater, um a um, os argumentos trazidos pela parte, desde que os fundamentos utilizados tenham sido suficientes para embasar a decisão.
3. A revisão do julgado, com manifesto caráter infringente, revela-se inadmissível, em sede de embargos. (Precedentes: AI n. 799.509-AgR-ED, Relator o Ministro Marco Aurélio, 1ª Turma, DJe de 8/9/2011; e RE n. 591.260-AgR-ED, Relator o Ministro Celso de Mello, 2ª Turma, DJe de 9/9/2011).
4. In casu, o acórdão originariamente recorrido assentou: “ADMINISTRATIVO. CONSTITUCIONAL. CONCURSO PÚBLICO. PROFESSOR. CANDIDATO APROVADO FORA DO NÚMERO DE VAGAS PREVISTO NO EDITAL. EXPECTATIVA DE DIREITO À NOMEAÇÃO. POSTERIOR CONTRATAÇÃO TEMPORÁRIA. EXISTÊNCIA DE VAGAS NO PRAZO DE VALIDADE DO CONCURSO PARA O MESMO CARGO COMPROVADA. DIREITO LÍQUIDO E CERTO À NOMEAÇÃO.”
5. Embargos de declaração DESPROVIDOS.

Ext N. 1.321-DF
RELATORA: MIN. ROSA WEBER
EMENTA: EXTRADIÇÃO EXECUTÓRIA. HOMICÍDIO. DUPLA INCRIMINAÇÃO CONFIGURADA. PRESCRIÇÃO. INOCORRÊNCIA. INEXISTÊNCIA DE ÓBICES LEGAIS À EXTRADIÇÃO. ENTREGA CONDICIONADA À ASSUNÇÃO DE COMPROMISSOS. AFASTAMENTO DA PENA ACESSÓRIA DE “INTERDIÇÃO PERPÉTUA DO EXERCÍCIO DE FUNÇÕES PÚBLICAS”.
1. Pedido de extradição formulado pelo Governo da Itália que atende os requisitos da Lei 6.815/1980 e do Tratado de Extradição específico.
2. Crime de homicídio que corresponde ao crime previsto no art. 121 do Código Penal Brasileiro. Dupla incriminação atendida.
3. Inocorrência de prescrição e inexistência de óbices legais.
4. O compromisso de detração da pena, considerando o período de prisão decorrente da extradição, deve ser assumido antes da entrega do preso, não obstando a concessão da extradição. O mesmo é válido para os demais compromissos previstos no art. 91 da Lei nº 6.815/1980.
5. Afastamento da pena acessória incompatível com a vedação prevista no art. 5º, XLVII, “b”, da Constituição da República, que proíbe sanções penais de caráter perpétuo. Precedentes.
6. Extradição deferida.

QUEST. ORD. EM AP N. 711-RR
RELATOR: MIN. DIAS TOFFOLI
EMENTA: Ação penal. Crime de peculato (CP, art. 312). Deputado federal eleito. Mandato cassado por tribunal regional eleitoral local e posteriormente restabelecido por força de decisão do Tribunal Superior Eleitoral. Prerrogativa de foro a partir da publicação do acórdão (CF, art. 53, § 1º). Competência do Supremo Tribunal Federal. Incompetência do juízo criminal prolator da decisão condenatória. Sentença nula. Questão de ordem resolvida no sentido de declarar-se a nulidade da decisão.
1. A partir da publicação do acórdão do Tribunal Superior Eleitoral, que reformou a decisão de cassação de mandato proferida pelo Tribunal Regional Eleitoral de Roraima, o réu recuperou o mandato de deputado federal, passando, então, ao Supremo Tribunal Federal a competência para processar e julgar o feito, nos termos do estatuído no art. 53, § 1º, da Constituição Federal.
2. A sentença condenatória foi prolatada por juízo incompetente, sendo manifesta sua nulidade.
3. Questão de ordem resolvida no sentido de se declarar nula a referida decisão.

HC N. 115.524-BA
RELATOR: MIN. GILMAR MENDES
Habeas corpus. 2. Homicídio duplamente qualificado. Pronúncia. Recurso especial inadmitido. Interposição de agravo de instrumento. 3. Autos retirados do cartório pelo advogado do outro corréu. Pedido de devolução do prazo indeferido. 4. A Secretaria da Corte estadual desconsiderou o prazo comum para as partes. Injusto obstáculo imputável ao aparelho judiciário. 5. Ordem concedida para determinar a devolução do prazo à defesa para interposição do agravo de instrumento contra a decisão que inadmitiu o recurso especial.

AG. REG. NA Rcl N. 8.559-SP
RELATORA: MIN. CÁRMEN LÚCIA
EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL NA RECLAMAÇÃO. FIXAÇÃO DA BASE DE CÁLCULO DO ADICIONAL DE INSALUBRIDADE. ALEGADO DESCUMPRIMENTO DA SÚMULA VINCULANTE N. 4. CONTROVÉRSIA SOBRE OS LIMITES DE INSTRUMENTOS COLETIVOS DE TRABALHO. AGRAVO REGIMENTAL AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO.

HC N. 119.558-ES
RELATORA: MIN. CÁRMEN LÚCIA
EMENTA: HABEAS CORPUS. CONSTITUCIONAL. PENAL. CRIME DE ESTUPRO. IMPOSIÇÃO DE REGIME INICIAL MAIS GRAVOSO. CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS DESFAVORÁVEIS. PRETENSÃO DE AFASTAMENTO DAS CONCLUSÕES DAS INSTÂNCIAS ORDINÁRIAS.
NECESSIDADE DE REEXAME DE FATOS E PROVAS: INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. ORDEM DENEGADA.
1. É válida a decisão que fixa o regime inicial mais gravoso com base nas circunstâncias judiciais desfavoráveis (Código Penal, arts. 33, §3º e 59), não se prestando o habeas corpus para ponderar, em concreto, a suficiência dos dados assentados: Precedentes.
2. O reexame dos elementos de convicção considerados pelas instâncias ordinárias na avaliação das circunstâncias judiciais do art. 59 do Código Penal demandaria o revolvimento do conjunto probatório, inviável em habeas corpus.
3. Ordem denegada.
Acórdãos Publicados: 187



T R A N S C R I Ç Õ E S


Com a finalidade de proporcionar aos leitores do INFORMATIVO STF uma compreensão mais aprofundada do pensamento do Tribunal, divulgamos neste espaço trechos de decisões que tenham despertado ou possam despertar de modo especial o interesse da comunidade jurídica.

Procurador do Estado - Atividade de Consultoria Jurídica - Exclusividade - Advocacia de Estado (CF, art. 132) (Transcrições)

ADI 4.843-MC/PB

RELATOR: Ministro Celso de Mello

DECISÃO: Trata-se de ação direta, com pedido de medida cautelar, que, proposta pela Associação Nacional dos Procuradores de Estado – ANAPE, visa à declaração de inconstitucionalidade “(...) da alínea ‘a’, do inciso I, do art. 3º da Lei Estadual nº 8.186 de 2007, na parte em que dá poderes à Secretaria de Estado de Governo a promover a ‘assessoria, na elaboração de documentos jurídicos’ diretamente ao Chefe do Poder Executivo; e dos artigos 16 e 19, e do Anexo IV da mesma Lei (nº 8.186 de 2007), e alterações referidas, mormente pelos anexos das leis 9332/2011 e 9350/2011, todos esses apenas quando se referem aos itens que criam os cargos de consultor jurídico do governo, coordenador da assessoria jurídica, e assistente jurídico, por violação ao art. 132 da Constituição da República (...)” (grifei).

1. Normas estaduais impugnadas.
Os preceitos normativos em questão possuem o seguinte conteúdo material:

“LEI Nº 8.186, DE 16 DE MARÇO DE 2007
Art. 3º. Os Órgãos integrantes da Estrutura Organizacional da Administração Direta do Poder Executivo têm as seguintes finalidades e competências:
I – SECRETARIA DE ESTADO DE GOVERNO
a) apoiar o Chefe do Poder Executivo em assuntos relativos à gestão da administração pública, através da assessoria, na elaboração de documentos jurídicos, na sua publicação, veiculação e em outras providências que se fizerem necessárias;
(...)
Art. 16. Ficam criados e integrados à Estrutura Organizacional do Poder Executivo os cargos, de provimento em comissão, definidos no Anexo II desta lei, necessários ao funcionamento dos órgãos constantes no Art. 1º, salvo da Procuradoria Geral do Estado e da Defensoria Pública.
(...)
Art. 19. Ficam definidos, na forma do Anexo IV desta lei, os cargos de provimento em comissão e as funções gratificadas, criados na forma dos artigos anteriores, pertencentes às estruturas dos órgãos definidos no Art. 1º, salvo da Procuradoria Geral do Estado e da Defensoria Pública.
[…]
ANEXO IV
Cargos Integrantes da Estrutura Organizacional dos Órgãos da Administração Direta Estadual

CARGO / SÍMBOLO / QUANTITATIVO
(…)
2. (…)
- Consultor Jurídico do Governo CAD-1 / 1
- Secretário da Consultoria Jurídica do Governo CAD-7 / 1
- Coordenador de Apoio Administrativo da Consultoria Jurídica do Governo CAD-4 /1
- Assistente Jurídico da Consultoria Jurídica do Governo CAD-6 / 3
3. (…)
- Coordenador da Assessoria Jurídica da Controladoria Geral do Estado CAD-4 / 1
- Assistente Jurídico da Controladoria Geral do Estado CAD-6 / 2
4. (…)
- Coordenador da Assessoria Jurídica da Secretaria de Estado da Comunicação Institucional CAD-4 / 1
- Assistente Jurídico da Assessoria Jurídica da Secretaria de Estado da Comunicação institucional CAD-6 / 1
5. (…)
- Coordenador da Assessoria Jurídica da Secretaria de Estado da Administração CAD-4 / 1
- Assistente Jurídico da Assessoria Jurídica da Secretaria de Estado da Administração CAD-6 / 13
6. (…)
- Coordenador da Assessoria Jurídica da Secretaria de Estado do Planejamento e Gestão CAD-4 / 1
- Assistente Jurídico da Assessoria Jurídica da Secretaria de Estado do Planejamento e Gestão CAD-6 / 2
7. (...)
- Coordenador da Assessoria Jurídica da Secretaria de Estado das Finanças CAD-4 / 1
8. (…)
- Coordenador da Assessoria Jurídica da Secretaria de Estado da Receita CAD-4 / 1
- Assistente Jurídico da Assessoria Jurídica da Secretaria de Estado da Receita CAD-6 / 3
9. (…)
- Coordenador da Assessoria Jurídica da Secretaria de Estado da Educação CAD-4 / 1
(alterado pelo Anexo Único da Lei nº 9.332/2011)
10. (…)
- Coordenador da Assessoria Jurídica da Secretaria de Estado da Saúde CAD-4 / 1
- Assistente Jurídico da Assessoria Jurídica da Secretaria de Estado da Saúde CAD-6 / 2
11. (…)
- Coordenador da Assessoria Jurídica da Secretaria de Estado da Segurança e da Defesa Social CAD-4 / 1
- Assistente Jurídico da Assessoria Jurídica da Secretaria de Estado de Segurança e da Defesa Social CAD-6 / 3
12. (…)
- Coordenador da Assessoria Jurídica da Secretaria de Estado da Administração Penitenciária CAD-4 / 1 (alterado pelo Anexo Único da Lei nº 9.332/2011)
- Assistente Jurídico da Assessoria Jurídica da Secretaria de Estado da Administração Penitenciária CAD-6 / 2 (alterado pelo Anexo Único da Lei nº 9.332/2011)
13. (…)
- Coordenador da Assessoria Jurídica da Secretaria de Estado do Desenvolvimento Humano CAD-4 / 1
- Assistente Jurídico da Assessoria Jurídica da Secretaria de Estado do Desenvolvimento Humano CAD-6 / 1
14. (...)
- Coordenador da Assessoria Jurídica da Secretaria de Estado da Cultura CAD-4 / 1 (alterado pelo Anexo Único da Lei nº 9.332/2011)
- Assistente Jurídico da Assessoria Jurídica da Secretaria de Estado da Cultura CAD-6 / 1 (alterado pelo Anexo Único da Lei nº 9.332/2011)
15. (…)
- Coordenador da Assessoria Jurídica da Secretaria de Estado da Infra-Estrutura CAD-4 / 1
- Assistente Jurídico da Assessoria Jurídica da Secretaria de Estado da Infra-Estrutura CAD-6 / 1
16. (…)
- Coordenador da Assessoria Jurídica da Secretaria de Estado do Turismo e do Desenvolvimento
Econômico CAD-4 / 1
- Assistente Jurídico da Assessoria Jurídica da Secretaria de Estado do Turismo e do Desenvolvimento
Econômico CAD-6 / 2
17. (…)
- Coordenador da Assessoria Jurídica da Secretaria de Estado da Ciência e do Meio Ambiente CAD-4 / 1
- Assistente Jurídico da Assessoria Jurídica da Secretaria de Estado da Ciência e do Meio Ambiente CAD-6 / 1
18. (...)
- Coordenador da Assessoria Jurídica da Secretaria de Estado do Desenvolvimento da Agropecuária e da
Pesca CAD-4 / 1
- Assistente Jurídico da Assessoria Jurídica da Secretaria de Estado do Desenvolvimento da Agropecuária e da
Pesca CAD-6 / 2
19. (…)
- Coordenador da Assessoria Jurídica da Secretaria de Estado da Juventude, Esporte e Lazer CAD-4 / 1
- Assistente Jurídico da Assessoria Jurídica da Secretaria de Estado da Juventude, Esporte e Lazer CAD-6 / 1
(…)
20. (…)
- Coordenador da Assessoria Jurídica da Secretaria de Estado da Interiorização da Ação do Governo CAD-4 / 1
- Assistente Jurídico da Assessoria Jurídica da Secretaria de Estado da Interiorização da Ação do
Governo CAD-6 /1
21. (…)
- Coordenador da Assessoria Jurídica da Secretaria de Estado do Desenvolvimento e da Articulação
Municipal CAD-4 / 1
(alterado pelo Anexo I da Lei nº 9.350/2011).” (grifei)

2. Fundamento da pretensão de inconstitucionalidade.
Sustenta-se, na presente sede de controle abstrato, em síntese, que referidos dispositivos do diploma legislativo estadual ora impugnado teriam incorrido em transgressão ao art. 132 da Constituição da República, considerados os fundamentos que assim foram expostos pela ANAPE:

“(...) a consultoria e a representação judicial são tarefas que apenas os Procuradores de Estado, organizados em carreira em cada Unidade Federativa, podem desempenhar. Essa foi a forma encontrada para permitir e estimular, em cada uma das estruturas estatais, a efetiva concretização dos princípios constitucionais atinentes à Administração Pública. Isso porque, num Estado Democrático de Direito não há discricionariedade estatal em se submeter às leis e decisões judiciais. Isto é, os órgãos de exercício das funções essenciais do poder político também estão submetidos à normatividade jurídica e os Procuradores do Estado são os agentes encarregados de velar por essa submissão do Poder ao Direito. Dessa forma esses agentes contribuem até mesmo para o desafogamento de demandas no próprio judiciário, conduzindo o ente estatal a um norte de legitimidade e prudência.
Salta aos olhos o propósito resultante da dicção dos dispositivos questionados, qual seja, de retirar dos Procuradores do Estado da Paraíba a prerrogativa constitucional de exclusividade na consultoria e assessoria jurídicas e na representação judicial. Ora, é possível que a interpretação conduza a um resultado que permita aos assistentes jurídicos e demais comissionados a atribuição das mesmas funções dos Procuradores na Administração Direta.
Como dito, a exclusividade dessas atividades de representação e consultoria jurídica da unidade federada não pode ser afrontada por dispositivo infraconstitucional estadual que delegue as mesmas funções e prerrogativas a outros agentes públicos. Por isso, a criação de cargos de assessores jurídicos, sejam assistentes, consultores ou outra nomenclatura atribuída pela norma, é totalmente inconstitucional. (…).
…...................................................................................................
O tema ganha contornos tão evidentes na jurisprudência da Corte, que se encontra em trâmite a Proposta de Súmula Vinculante n. 18, reconhecendo taxativamente que o exercício das funções da Advocacia Pública constitui atividade exclusiva dos advogados públicos efetivos, organizados em carreira e aprovados em concurso público, revelando-se de sua teleologia que não é permitido a terceiros, senão aos próprios advogados públicos, o exercício das funções de representação do Estado e sua consultoria jurídica.” (grifei)

Solicitadas, previamente, as informações necessárias à apreciação do pedido de medida cautelar, prestaram-nas o Governador e a Assembleia Legislativa do Estado da Paraíba, defendendo, ambos, a plena constitucionalidade das normas ora questionadas.
3. Manifestações (parcialmente) favoráveis da AGU e da PGR.
Ante a relevância do tema versado na presente ação direta, determinei a audiência prévia do eminente Advogado-Geral da União, que se pronunciou pela parcial procedência do pedido formulado nesta sede processual, enfatizando, de outro lado, que o juízo de inconstitucionalidade somente não deve atingir “os artigos 16 e 19 da Lei nº 8.186/07, os quais permanecem válidos em relação aos demais cargos comissionados definidos nos anexos desse diploma legal que não envolvam o assessoramento jurídico combatido pela requerente” (grifei).
O Ministério Público Federal, por sua vez, em pronunciamento emanado da douta Procuradoria-Geral da República, ao opinar na presente sede de fiscalização normativa abstrata, manifestou-se em parecer assim ementado:

“Ação direta de inconstitucionalidade. Dispositivos da Lei 8.186/2007, do Estado da Paraíba. Criação de cargos de provimento em comissão para consultoria jurídica do Poder Executivo. Preliminar. Não conhecimento quanto aos cargos constantes do Anexo II, referido pelo art. 16, e que não possuem natureza de consultoria jurídica. Mérito. Atribuição exclusiva dos Procuradores dos Estados (art. 132, da CR). Parecer pela parcial procedência do pedido.” (grifei)

Sendo esse o contexto, e subsistindo as razões de urgência invocadas pela autora (ANAPE), passo a apreciar, “ad referendum” do E. Plenário deste Tribunal (RISTF, art. 21, V), o pedido de suspensão cautelar de eficácia das normas legais ora impugnadas.
4. Legitimidade ativa “ad causam” da ANAPE: Precedentes.
Reconheço, preliminarmente, que a ANAPE dispõe de legitimidade ativa “ad causam” para fazer instaurar este processo de controle normativo abstrato, considerando, para tanto, precedentes firmados pelo Supremo Tribunal Federal (ADI 159/PA, Rel. Min. OCTAVIO GALLOTTI – ADI 824-MC/MT, Rel. Min. FRANCISCO REZEK – ADI 1.120-MC/PA, Rel. Min. CARLOS VELLOSO – ADI 1.557/DF, Rel. Min. ELLEN GRACIE – ADI 1.679/GO, Rel. Min. GILMAR MENDES – ADI 4.261/RO, Rel. Min. AYRES BRITTO, v.g.).
Impende assinalar, neste ponto, que o exame dos estatutos sociais da ANAPE – que congrega membros componentes da carreira jurídica de Procurador dos Estados-membros e do Distrito Federal – evidencia que se trata de entidade de classe de âmbito nacional, cuja estrutura permite assimilá-la a outras entidades de classe, como a CONAMP (RTJ 189/200), a AMB (ADI 3.053/PA), a ADEPOL (ADI 1.517/União Federal), a ANAUNI (RTJ 186/969-970), a AJUFE (ADI 3.126/DF) e a ANAMATRA (ADI 2.885/SE), a quem esta Suprema Corte reconheceu assistir qualidade para agir em sede de fiscalização abstrata de constitucionalidade.
5. Configuração, na espécie, do vínculo de pertinência temática.
Cabe verificar, agora, se se registra, na espécie, o requisito concernente à pertinência temática, que se caracteriza – na linha do magistério jurisprudencial que esta Corte firmou na matéria – pela existência de nexo de afinidade entre os objetivos institucionais da associação de classe que ajuíza a ação direta e o conteúdo material do diploma legislativo por ela impugnado em referida sede processual.
Entendo existir, no caso, o nexo de pertinência temática, eis que o conteúdo do diploma estadual ora questionado – criação de cargos/funções típicas de consultoria e de assistência jurídica do Poder Executivo estadual – relaciona-se, de modo direto, com a finalidade institucional da entidade de classe autora, como resulta claro do art. 1º do seu estatuto social, que prevê, dentre os objetivos da ANAPE, o de “representar e defender, de forma exclusiva, em nível nacional, os interesses relacionados com o exercício funcional dos seus associados, ativos e inativos, bem como no sentido de consolidar a Advocacia de Estado como instituição essencial à Justiça, ao regime de legalidade da Administração Pública e ao Estado Democrático de Direito”.
Vale relembrar, no ponto, que a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, ao interpretar o alcance da cláusula inscrita no art. 103, inciso IX, da Carta Política – e após definir o vínculo de pertinência temática como requisito caracterizador da própria legitimidade ativa “ad causam” das entidades de classe e das confederações sindicais para o processo de controle abstrato de constitucionalidade (ADI 138-MC/RJ, Rel. Min. SYDNEY SANCHES – ADI 396-MC/DF, Rel. Min. PAULO BROSSARD – ADI 1.037-MC/SC, Rel. Min. MOREIRA ALVES – ADI 1.096-MC/RS, Rel. Min. CELSO DE MELLO – ADI 1.159-MC/AP, Rel. Min. ILMAR GALVÃO – ADI 1.414-MC/RS, Rel. Min. SYDNEY SANCHES) –, firmou orientação no sentido de atribuir, à ANAPE, qualidade para agir em sede jurisdicional concentrada, sempre que o conteúdo normativo da regra estatal impugnada suscitar, como na espécie, discussão sobre questões concernentes às prerrogativas institucionais, direitos e interesses dos Procuradores do Estado e da própria Advocacia de Estado.
Assiste razão, portanto à ANAPE, quando sustenta dispor de legitimação para agir, perante o Supremo Tribunal Federal, em sede de fiscalização abstrata de constitucionalidade, e, ainda, quando afirma registrar-se, na espécie, a presença do vínculo de pertinência temática:

“A legitimidade ativa da ANAPE para a provocação do controle abstrato de constitucional idade em face de preceitos atinentes à mesma matéria aqui debatida já foi reconhecida por esta Excelsa Corte, sendo bastante mencionar o julgamento de mérito das ADI’s nºs 1557, relatora Ministra Ellen Gracie; 1679, relator Ministro Gilmar Mendes; e 4261, da relatoria do Ministro Carlos Ayres Britto.
Esse reconhecimento da relação de pertinência temática entre os objetivos institucionais dessa entidade de classe de âmbito nacional e o interesse específico na impugnação estabeleceu premissa segundo a qual a representação e a consultoria dos Estados e do Distrito Federal são prerrogativas institucionais e exclusivas dos Procuradores dessas unidades federadas.” (grifei)

Tenho para mim, desse modo, que a ANAPE possui legitimidade ativa “ad causam” para promover a presente ação direta de inconstitucionalidade.
6. Possibilidade jurídica de o Advogado-Geral da União pronunciar-se, eventualmente, pela inconstitucionalidade do ato normativo impugnado. Precedentes.
Observo, de outro lado, que o eminente Advogado-Geral da União, ao pronunciar-se pela parcial inconstitucionalidade do diploma legislativo ora impugnado, justificou a possibilidade de assim proceder, considerada a “autonomia do Advogado-Geral da União [para] contrapor-se à constitucionalidade das normas submetidas ao seu exame. na jurisdição concentrada de constitucionalidade, notadamente quando houver precedente no mesmo sentido” (grifei).
Entendo assistir plena razão, por isso mesmo, ao eminente Advogado - Geral da União quando sustenta ser possível, não obstante a regra inscrita no art. 103, § 3º, “in fine”, da Constituição, manifestar-se pela inconstitucionalidade do ato estatal impugnado em sede de controle abstrato, uma vez existindo precedentes firmados pelo Supremo Tribunal Federal na matéria em discussão.
A jurisprudência desta Suprema Corte já se consolidou no sentido de que o Advogado-Geral da União – que, em princípio, atua como curador da presunção de constitucionalidade do ato impugnado (RTJ 131/470 – RTJ 131/958 – RTJ 170/801-802, v.g.) – não está obrigado a defender, incondicionalmente, o diploma estatal, se este veicular conteúdo normativo já declarado incompatível com a Constituição da República pelo Supremo Tribunal Federal em julgamentos proferidos no exercício de sua jurisdição constitucional:

“ATUAÇÃO DO ADVOGADO-GERAL DA UNIÃO NO PROCESSO DE CONTROLE NORMATIVO ABSTRATO.
- O Advogado-Geral da União – que, em princípio, atua como curador da presunção de constitucionalidade do ato impugnado (RTJ 131/470 – RTJ 131/958 – RTJ 170/801-802, v.g.) – não está obrigado a defender o diploma estatal, se este veicular conteúdo normativo já declarado incompatível com a Constituição da República pelo Supremo Tribunal Federal em julgamentos proferidos no exercício de sua jurisdição constitucional. Precedentes.”
(ADI 2.681-MC/RJ, Rel. Min. CELSO DE MELLO)

Vale rememorar, no ponto, que o Supremo Tribunal Federal, por mais de uma vez, já teve a oportunidade de advertir que “o Advogado-Geral da União não está obrigado a defender tese jurídica se sobre ela esta Corte já fixou entendimento pela sua inconstitucionalidade” (ADI 1.616/PE, Rel. Min. MAURÍCIO CORRÊA – grifei). Esse entendimento jurisprudencial veio a ser reafirmado quando do julgamento da ADI 2.101/MS, Rel. Min. MAURÍCIO CORRÊA, e da ADI 3.916/DF, Rel. Min. EROS GRAU.
Sob tal perspectiva, revela-se plenamente legítima, portanto, a posição jurídica adotada, nesta sede de fiscalização normativa abstrata, pelo Senhor Advogado-Geral da União.
7. O significado e o alcance da regra inscrita no art. 132 da Constituição da República: exclusividade e intransferibilidade, a pessoas estranhas ao quadro da Advocacia de Estado, das funções constitucionais de Procurador do Estado e do Distrito Federal. Doutrina. Precedentes do STF.
Superadas as questões preliminares, passo a analisar o pedido de suspensão cautelar de eficácia das normas legais ora impugnadas.
A autora questiona a validade de referidas normas legais, por entendê-las incompatíveis com a cláusula fundada no art. 132 da Constituição da República:

“Essa regra do art. 132 instituiu uma mitigação da capacidade de auto-organização que resulta da autonomia dos Estados (art. 25, § 1º, da Constituição), ao determinar que a presença dos Procuradores na organização administrativa do Estado é obrigatória e inafastável. Assim, a previsão, por qualquer lei, de que outros agentes públicos exerçam funções similares ou coincidentes representa uma burla à vontade do constituinte.
A previsão, em sede constitucional, da atuação dos Procuradores dos Estados e do Distrito Federal, obrigatoriamente organizados em carreira, radicou na necessidade, verificada durante o funcionamento da Assembleia Nacional Constituinte, de se garantir às Unidades Federadas um corpo jurídico estruturado e bem preparado para as tarefas de orientação jurídica, com isenção e imparcialidade, e defesa da legalidade e da constitucionalidade em todos os contextos de funcionamento da Administração Pública estadual.
Esses requisitos constitucionais de investidura, aliados ao caráter efetivo do provimento, asseguram requisitos mínimos de qualificação e independência funcional, além de impessoalidade e tecnicalidade com os quais a função deve ser exercida. Afasta-se, assim, desses cargos, a figura dos protegidos políticos, dos pareceres encomendados, da defesa propositadamente deficiente. A preocupação fica ainda mais relevante na área de licitações e contratos. Ora, como admitir a atuação de um comissionado em tais casos? Qual o requisito para a investidura num cargo assim? Ora, não precisa mais que uma assinatura do governador.
A mínima experiência de vida demonstra que se um titular de cargo demissível ad nutum ‘contrariar interesses’ será, certamente, substituído imediatamente por alguém que se dobre em troca do cargo.” (grifei)

Os padrões normativos de confronto são aqueles consubstanciados no art. 132 da Constituição – que conferiu aos Procuradores do Estado, organizados em carreira na qual o ingresso depende de concurso público de provas e de títulos, o monopólio das funções consultivas e de assessoramento na área jurídica – e no art. 69 do ADCT, que admitiu a coexistência de Consultorias Jurídicas e de Procuradorias-Gerais naquelas unidades da Federação onde essa dualidade orgânica já existisse à época da promulgação da Lei Fundamental.
A Constituição de 1988 prescreve, em seu art. 132, o que se segue:

“Art. 132. Os Procuradores dos Estados e do Distrito Federal, organizados em carreira, na qual o ingresso dependerá de concurso público de provas e títulos, com a participação da Ordem dos Advogados do Brasil em todas as suas fases, exercerão a representação judicial e a consultoria jurídica das respectivas unidades federadas.
Parágrafo único. Aos procuradores referidos neste artigo é assegurada estabilidade após três anos de efetivo exercício, mediante avaliação de desempenho perante os órgãos próprios, após relatório circunstanciado das corregedorias.” (grifei)

A outorga dessas funções jurídicas à Procuradoria-Geral do Estado – mais precisamente aos Procuradores do Estado – decorre de um modelo estabelecido pela própria Constituição Federal, que, ao institucionalizar a Advocacia de Estado, delineou o seu perfil e discriminou as atividades inerentes aos órgãos e agentes que a compõem.
O conteúdo normativo do art. 132 da Constituição da República revela os limites materiais em cujo âmbito processar-se-á a atuação funcional dos integrantes da Procuradoria-Geral do Estado e do Distrito Federal. Nele, contém-se norma de eficácia vinculante e cogente para as unidades federadas locais, que não permite conferir a terceiros – senão aos próprios Procuradores do Estado e do Distrito Federal – o exercício, intransferível e indisponível, das funções de representação judicial e de consultoria jurídica da respectiva unidade federada.
JOSÉ AFONSO DA SILVA (“Curso de Direito Constitucional Positivo”, p. 637, item n. 19, 36ª ed., 2013, Malheiros), após vincular as funções institucionais da Procuradoria-Geral do Estado ao domínio da Advocacia Pública (ou de Estado) e ao concluir pela inalterabilidade e indisponibilidade das funções institucionais deferidas aos Procuradores dos Estados e do Distrito Federal, expende magistério irrepreensível sobre o tema:

“Procuradorias e consultorias estaduais. A carreira de Procurador de Estado e do Distrito Federal foi institucionalizada em nível de Constituição Federal. Isso significa a institucionalização dos órgãos estaduais de representação e de consultoria dos Estados, uma vez que os Procuradores a que se incumbe essa função, no art. 132 daquela Carta Magna, hão de ser organizados em carreira dentro de uma estrutura administrativa unitária em que sejam todos congregados, ressalvado o disposto no art. 69 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, que autoriza os Estados a manter consultorias jurídicas separadas de suas Procuradorias-Gerais ou Advocacias-Gerais, desde que, na data da promulgação da Constituição, tenham órgãos distintos para as respectivas funções (…).
Essa disposição transitória teve a vantagem de enunciar os órgãos a que, nos Estados e Distrito Federal, incumbem a respectiva representação judicial e serviços de consultoria, quais sejam: Procuradorias-Gerais (...) ou Advocacias-Gerais (...). Então, temos, combinado o disposto no art. 132 e com o art. 69 do ADCT, a institucionalização das Procuradorias-Gerais dos Estados e das Advocacias-Gerais, onde houver, sem prejuízo de que cada Estado fique com a liberdade de alterar a denominação, entre aquelas, mas não de mudar suas funções de representação e consultoria, nem a denominação de seus membros: Procurador do Estado ou do Distrito Federal, inclusive para o órgão com o nome de Advocacia-Geral do Estado.
Os Procuradores dos Estados e do Distrito Federal, que receberão remuneração na forma de subsídio, consoante o art. 39, § 4º (EC-19/98), hão de ser organizados em carreira, na qual ingressarão por concurso público de provas e títulos (art. 132), com a participação da Ordem dos Advogados do Brasil, em todas as suas fases, assegurada a eles a estabilidade após três anos de efetivo exercício, mediante avaliação de desempenho perante os órgãos próprios, após relatório circunstanciado das corregedorias (EC-19/98). É, pois, vedada a admissão ou contratação de advogados para o exercício das funções de representação judicial (salvo, evidentemente, impedimento de todos os Procuradores) e de consultoria daquelas unidades federadas, porque não se deram essas funções aos órgãos, mas foram diretamente imputadas aos Procuradores.” (grifei)

Também CELSO BASTOS (“Curso de Direito Constitucional”, p. 341, 11ª ed., 1989, Saraiva), publicista eminente, perfilha igual entendimento, acentuando que o constituinte federal, após institucionalizar as Procuradorias-Gerais no plano dos próprios Estados-membros, contemplou a figura do Procurador do Estado e a este deferiu, em específica norma de atribuição, “a incumbência de exercer a representação judicial e a consultoria jurídica das respectivas unidades federadas”.
Por essa razão, o saudoso Professor TOMÁS PARÁ FILHO, da Faculdade de Direito da USP, ao examinar a natureza e os fins jurídico - institucionais da Advocacia de Estado (RPGESP, vol. 2/286-287), assevera que “o Procurador do Estado é, e deve ser, órgão de colaboração e representação, fora do ordenamento estritamente burocrático. Sua atividade corresponde, tão só, à advocacia preventiva e ativa em prol do Estado” (grifei).
A representação institucional do Estado-membro em juízo ou em atividade de consultoria jurídica traduz prerrogativa de índole constitucional outorgada, pela Carta Federal (art. 132), aos Procuradores do Estado. Operou-se, nesse referido preceito da Constituição, uma inderrogável imputação de específica atividade funcional cujos destinatários são, exclusivamente, os Procuradores do Estado.
Assim sendo, há de se ter presente, no exame do tema, a nova realidade constitucional emergente da Carta Federal de 1988, que institucionalizou, no plano da Advocacia Pública local, a Procuradoria-Geral dos Estados, órgão ao qual incumbe, “ope constitutionis”, dentre outras atribuições, a consultoria jurídica da própria unidade federada, inclusive de seu Poder Executivo.
No contexto normativo que emerge do art. 132 da Constituição, e numa análise preliminar do tema, compatível com o juízo de delibação ora exercido, parece não haver lugar para nomeações em comissão de pessoas, estranhas aos quadros da Advocacia de Estado, que venham a ser designadas, no âmbito do Poder Executivo, para o exercício de funções de assistência, de assessoramento e/ou de consultoria na área jurídica.
A exclusividade dessa função de consultoria remanesce, agora, na esfera institucional da Advocacia Pública, a ser exercida, no plano dos Estados-membros, por suas respectivas Procuradorias-Gerais e pelos membros que as compõem, uma vez regularmente investidos, por efeito de prévia aprovação em concurso público de provas e de títulos, em cargos peculiares à Advocacia de Estado, o que tornaria inadmissível a investidura, mediante livre provimento em funções ou em cargos em comissão, de pessoas para o desempenho, no âmbito do Poder Executivo do Estado-membro, de atividades de consultoria ou de assessoramento jurídicos.
Extremamente precisa, quanto a esse ponto, a lição de MÁRIO BERNARDO SESTA (“Advocacia de Estado: Posição Institucional”, “in” Revista de Informação Legislativa, vol. 117/187-202, 198, 1993):

“Assim, são incompatíveis com a caracterização da Advocacia do Estado, salvo em hipóteses excepcionais, as formas de investidura marcadas pela precariedade, tais como o comissionamento, a contratação e qualquer outra modalidade de admissão de Advogados para o exercício dessa competência, que os deixe sujeitos ao ‘nuto’ de quem os tenha nomeado, admitido ou contratado.
A investidura institucional pressupõe, no mínimo, que os agentes da Advocacia do Estado sejam investidos em cargo público de provimento efetivo, só acessível mediante concurso público, e que a competência que lhes é própria decorra, no mínimo, da lei e, não, de ato administrativo.
O constituinte brasileiro, coerente com a visão que adotou da tutela do interesse estatal como função essencial à justiça, elevou a institucionalização da investidura dos agentes da Advocacia do Estado ao nível constitucional federal (CF/88, arts. 131 e 132), estabelecendo um novo marco na caracterização da atividade no contexto institucional brasileiro.” (grifei)

Essa prerrogativa institucional, que é de ordem pública, encontra assento na própria Constituição Federal. Não pode, por isso mesmo, comportar exceções nem sofrer derrogações sequer previstas ou autorizadas pelo próprio texto da Lei Fundamental.
Cabe registrar, por relevante, que esta Suprema Corte, ao apreciar o alcance do dispositivo constitucional ora em exame (CF, art. 132), firmou diretriz jurisprudencial no sentido de que o desempenho das atividades relacionadas à consultoria e ao assessoramento jurídicos prestados ao Poder Executivo estadual traduz prerrogativa outorgada, pela Carta Federal, exclusivamente aos Procuradores do Estado e do Distrito Federal (RTJ 166/94, Rel. Min. CELSO DE MELLO – RTJ 192/473-474, Rel. Min. ELLEN GRACIE – ADI 484/PR, Red. p/ acórdão Min. RICARDO LEWANDOWSKI – ADI 1.679/GO, Rel. Min. GILMAR MENDES, v.g.), valendo referir, por serem expressivas dessa orientação, decisões plenárias do Supremo Tribunal Federal consubstanciadas em acórdãos assim ementados:

“CONSTITUCIONAL. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. ANEXO II DA LEI COMPLEMENTAR 500, DE 10 DE MARÇO DE 2009, DO ESTADO DE RONDÔNIA. (...). MÉRITO. CRIAÇÃO DE CARGOS DE PROVIMENTO EM COMISSÃO DE ASSESSORAMENTO JURÍDICO NO ÂMBITO DA ADMINISTRAÇÃO DIRETA. INCONSTITUCIONALIDADE.
…...................................................................................................
2. A atividade de assessoramento jurídico do Poder Executivo dos Estados é de ser exercida por procuradores organizados em carreira, cujo ingresso depende de concurso público de provas e títulos, com a participação da Ordem dos Advogados do Brasil em todas as suas fases, nos termos do art. 132 da Constituição Federal. Preceito que se destina à configuração da necessária qualificação técnica e independência funcional desses especiais agentes públicos.
3. É inconstitucional norma estadual que autoriza a ocupante de cargo em comissão o desempenho das atribuições de assessoramento jurídico, no âmbito do Poder Executivo. Precedentes.
4. Ação que se julga procedente.”
(ADI 4.261/RO, Rel. Min. AYRES BRITTO – grifei)

“(...) 5. Viola o art. 37, incisos II e V, norma que cria cargo em comissão, de livre nomeação e exoneração, o qual não possua o caráter de assessoramento, chefia ou direção. Precedentes. Inconstitucionalidade dos dispositivos impugnados em relação aos cargos de Subprocurador-Geral do Estado e de Procurador de Estado Chefe. 6. Ação julgada parcialmente procedente.”
(ADI 2.682/AP, Rel. Min. GILMAR MENDES – grifei)

8. Configuração, na espécie, dos requisitos caracterizadores da plausibilidade jurídica e do “periculum in mora”.
Tendo presentes, desse modo, o conteúdo e o alcance da norma inscrita no art. 132 da Constituição, considero densa a plausibilidade jurídica da pretensão de inconstitucionalidade deduzida pela ANAPE.
A autora, ao formular sua pretensão cautelar, bem demonstrou a ocorrência, na espécie, do requisito pertinente ao “periculum in mora”, fazendo-o nos seguintes termos:

“Por outro lado, tem-se a presença do ‘periculum in mora’ consubstanciada inicialmente na prática de atos nulos, materializados em inúmeros pareceres jurídicos que são exarados em diversos ramos do direito público (seja em matéria de licitações e contratos, operações de crédito externo, servidores públicos, bens do domínio estadual, matéria previdenciária etc.) através de servidores que usurpam atribuições constitucionais dos Procuradores do Estado. A problemática somente tende a aumentar, a cada dia, com a insegurança jurídica e o grave risco de dilapidação do Erário, o que revela o grande interesse público envolvido. Essa circunstância foi e está sendo ressaltada pelo Tribunal de Contas Paraibano, conforme documentos anexos, o que pode gerar repercussões aos gestores.
Some-se a isso a cotidiana preterição dos Procuradores do Estado na atividade de consultoria jurídica, em perene e constante afronta ao preceptivo constitucional cuja violação sustenta o presente pleito.” (grifei)

Impõe-se relembrar, ainda, ante a sua extrema pertinência, decisão desta Corte na ADI 159/PA, onde se impugnava a transformação de cargos de Assistente Jurídico em outros de Consultor Jurídico, com os mesmos direitos e deveres de Procurador do Estado. Ao deferir a medida cautelar postulada – entendimento que afinal prevaleceu –, o eminente Relator, Ministro OCTAVIO GALLOTTI, assim se pronunciou (RTJ 132/38-39):

“Mesmo sem levar estritamente em conta o vulto dos encargos financeiros comprovados, o Supremo Tribunal, atento ao pressuposto de relevante conveniência pública, tem atendido ao requerimento de provimento cautelar, quando a alegação, revestida de razoabilidade, recaia sobre pontos particularmente sensíveis dos princípios que norteiam a Administração do Estado, entre eles o da exigência do concurso público (…).” (grifei)

9. Deferimento parcial, “ad referendum” do Plenário (RISTF, art. 21, V), do pedido de suspensão cautelar.
Sendo assim, e nos termos dos pareceres do eminente Advogado-Geral da União e da douta Procuradoria-Geral da República, defiro, em parte, “ad referendum” do E. Plenário desta Suprema Corte (RISTF, art. 21, V), o pedido de medida cautelar, para suspender, até final julgamento da presente ação direta, a eficácia, a execução e a aplicabilidade da alínea “a” do inciso I do art. 3º da Lei estadual nº 8.186, de 16 de março de 2007 (unicamente quanto à expressão “na elaboração de documentos jurídicos”) e dos itens ns. 2 a 21 (exclusivamente nos pontos que concernem a cargos e a funções de consultoria e de assessoramento jurídicos) do Anexo IV da mesma Lei nº 8.186, de 16 de março de 2007, alterada pelas Leis nºs. 9.332/2011 e 9.350/2011, todas editadas pelo Estado da Paraíba.
Comunique-se a presente decisão à autora desta ação direta, ao Senhor Governador do Estado da Paraíba e à Augusta Assembleia Legislativa dessa mesma unidade da Federação.
Publique-se.
Brasília, 19 de dezembro de 2013.

Ministro CELSO DE MELLO
Relator

*decisão publicada no DJe de 3.2.2014



INOVAÇÕES LEGISLATIVAS


INTERNET – Uso – Acesso – Proteção – Privacidade
Lei nº 12.965, de 23.4.2014 – Estabelece princípios, garantias, direitos e deveres para o uso da Internet no Brasil. Publicada no DOU, Seção 1, p. 1, em 24.4.2014.

AÇÃO CIVIL PÚBLICA – Alteração – Inclusão – Proteção
Lei nº 12.966, de 24.4.2014 – Altera a Lei nº 7.347, de 24.7.1985 (Lei da Ação Civil Pública), para incluir a proteção à honra e à dignidade de grupos raciais, étnicos ou religiosos. Publicada no DOU, Seção 1, p. 2, em 25.4.2014.

OUTRAS INFORMAÇÕES

OUTRAS INFORMAÇÕES
21 a 25 de abril de 2014

Decreto nº 8.229, de 22.4.2014 - Altera o Decreto nº 660, de 25.9.1992, que institui o Sistema Integrado de Comércio Exterior - SISCOMEX, e dispõe sobre o Portal Único de Comércio Exterior. Publicado no DOU em 23.4.2014, Seção 1, p. 8.

Decreto nº 8.228, de 22.4.2014 - Estabelece regras especiais para concessão de diárias e passagens para servidores e militares em decorrência da Copa do Mundo FIFA 2014. Publicado no DOU em 23.4.2014, Seção 1, p. 7.

Decreto nº 8.227, de 22.4.2014 - Discrimina ações do Programa de Aceleração do Crescimento - PAC a serem executadas por meio de transferência obrigatória. Publicado no DOU em 23.4.2014, Seção 1, p. 1.

Decreto nº 8.231, de 25.4.2014 - Altera o Decreto nº 6.306, de 14.12.2007, que regulamenta o Imposto sobre Operações de Crédito, Câmbio e Seguro, ou relativas a Títulos ou Valores Mobiliários - IOF. Publicado no DOU em 25.4.2014, Seção 1, p. 1.

SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF) 
Prazo – Feriado - Suspensão 
Portaria nº 68/STF, de 22 de abril de 2014 – Comunica que fica suspenso o expediente da Secretaria do Tribunal no dia 1º de maio de 2014 (quinta-feira) e que os prazos que porventura devam iniciar-se ou completar-se nesse dia ficam automaticamente prorrogados para o dia 2 subsequente (sexta-feira). Publicada no DJE/STF, n. 68, p.179, em 25.4.201.


Secretaria de Documentação

Coordenadoria de Jurisprudência Comparada e Divulgação de JulgadosCJCD@stf.jus.br


FONTE - STF